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sábado, 26 de setembro de 2015

Educação médica e indústria farmacêutica

SM – O conflito de interesses na relação instituições/pesquisadores/indústria pode ser superado? De que forma? Os médicos têm força suficiente para não sucumbir ao assédio dos laboratórios? Um dos argumentos usados para justificar eventual dependência é que “as companhias propiciam educação médica continuada”.
Angell –
 Laboratórios farmacêuticos não deveriam participar da “educação” de médicos, pois não se espera que forneçam informações objetivas a respeito de produtos comercializados por eles próprios. Ou seja, cabe à profissão médica a responsabilidade pela sua própria educação. Para que as coisas caminhassem de maneira imparcial, penso que o patrocinador das pesquisas em universidades deveria ficar absolutamente fora dos estudos, o que significa não opinar nos desenhos, não tomar parte na análise dos dados ou na elaboração de artigos. Além disso, pesquisadores não poderiam ter outros vínculos financeiros, como aquele que os obriga a prestar consultorias patrocinadas pelos laboratórios financiadores de remédios. Finalmente, em suas práticas, os médicos não deveriam aceitar brindes da indústria farmacêutica. Nem mesmo os considerados insignificantes, pois a literatura mostra que, mesmo pequenos presentes, especialmente aqueles dados aos médicos em formação, criam o desejo de retribuir de alguma forma. Reconheço que essas sugestões parecem radicais hoje, porque médicos envolvidos nos âmbitos práticos e acadêmicos estão bem acostumados a receber grandes somas de dinheiro, jantares e presentes da indústria. Incidentalmente, isso provém do orçamento de marketing das companhias, pois não há verbas para “educação”.
SM – Atualmente, suas críticas em artigos e entrevistas direcionam-se aos tratamentos alternativos e ao uso de drogas psiquiátricas em crianças. Medicina alternativa é ruim? Há abusos na prescrição de antipsicóticos a crianças?
Angell –
 Discordo de toda a prática de medicina que não se baseie em boa pesquisa ou, pelo menos, em forte plausibilidade biológica. Por isso, tenho postura crítica em relação à medicina alternativa. Se tais práticas fossem testadas cientificamente, não seriam chamadas de alternativas. Quanto à segunda questão, drogas psiquiátricas certamente estão sendo prescritas de forma abusiva a crianças. Digo isso baseada em pronunciamentos de especialistas que, muitas vezes, contam com vínculos financeiros com laboratórios farmacêuticos, em vez de comprometimento com estudos científicos. Nos EUA, por exemplo, observa-se que problemas de comportamento motivados por fatores sociais, econômicos e familiares passaram a ser enquadrados na categoria “distúrbios psiquiátricos” porque os psiquiatras que definem essas doenças têm conflitos financeiros de interesse.

http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/marcia-angell-a-coragem-na-luta-contra-acao-de-laboratorios


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