A
nossa universidade não é uma universidade para produzir pensamento. A
única coisa que se produz na universidade é obediência. Se ensina o
estudante a obedecer. Tanto que eu luto com muitos de meus alunos quando
eles começam a dizer para mim: “eu não suporto mais". Eu digo: “Aguenta
a barra. Aguenta a barra e pega esse diploma. É um instrumento de
guerra”. Porque a universidade só passa isso para nós. Quando você
começa a verificar aulas que a questão passa a ser o pensament
o
o estudante fica inteiramente surpreendido. Ele não está habituado, não
está formado para isso. Porque desde os 3 anos de idade ele não para de
receber essas forças constituintes de marcas e sinais. E em linguagem
literária o que se produz é um homem dos hábitos. Um homem que tem um
conjunto de hábitos e julga que aquele conjunto de hábitos que ele tem é
a natureza dele. Então é preciso passar uma força, - sobretudo a
literatura é muito bonita para isso - de estranhamento. Abrir uma
espécie de buraco, onde você começa a verificar que sua natureza não é o
seu conjunto de hábitos. Quando a gente lê Michel Foucault a gente fica
muito surpreendido por causa dessas coisas. O Foucault quando vai
pensar a homossexualidade grega diz: “a homossexualidade grega não tem
nada ver com a homossexualidade do ocidente. Se vocês quiserem articular
a homossexualidade grega com a do ocidente vocês não irão entender
nada”. Aí o homem do hábito diz assim: “esse Foucault é um louco”. Aí
Foucault diz: “Sou. Porque é preciso ser louco para vencer os hábitos”.
Por isso que a loucura não para... A loucura e a literatura, a loucura e
a arte, a loucura e a filosofia não param de ser perseguidas pelas
forças repressivas do campo social, psiquiatria e etc... Porque é
exatamente isso. Para produzir esse mundo novo é preciso correr um risco
muito grande. Correr o risco de pensamento. E - aqui é de uma beleza
incrível - isso é o pensamento não naquilo que é real. E não naquilo que
é possível. A questão do pensamento é produzir o impossível. Produzir o
impensável. É exatamente o que Nietzsche fez! É exatamente o que
Spinoza fez! E além de todos os limites que nos foram dado por Kant era o
pensamento. Transgredir é muito mais do que transgredir, é produzir
exatamente um novo. Produzir impossibilidades!
Cláudio ULPIANO in: Pensamento e Liberdade em Spinoza. Aula gravada em 1988, no Planetário da Gávea, Rio de Janeiro-RJ.
Nenhum comentário:
Postar um comentário