1) A Associacao Brasileira de Psiquiatria (ABP) historicamente é um player privilegiado na arena política, disputando o discurso sobre o que é sofrimento, saúde mental e o que fazemos a partir disso.
2) A posição corporativa força espaço para recentrar os debates da Saúde Mental em termos exclusivos biomédicos, forçando a despolitizacao da pauta, ao orientar os debates em termos estritamente de eficiência - mesmo sendo o Brasil notadamente reconhecido justamente por seus resultados em relação a estratégias antimanicomiais de cuidado.
3) Notadamente as contradições estruturais no mundo e principalmente no Brasil, vêm operando na destruição das possibilidades plurais de existir, distanciando projetos de vida de suas possibilidades de realização, cada vez mais associados a um empreendedorismo de si mobilizador de verdadeiros "infartos psíquicos" (como diria Chul-Han). Exatamente aí a pauta da explosão das neuroses ocupa os noticiários.
4) O jogo imagético da ABP encontra eco entre os ultra-conservadores e espaço em um governo explicitamente bionecropolitico [seriam os mesmos?], surfando na "onda que pegou" de que as questões de Saúde Mental que devem ser privilegiada mente debatidas em regime de urgência, são a depressão e a ansiedade. A partir daí, questões como álcool e outras drogas podem ser deslocadas, reativando a falida perspectiva da abstinência no senso comum. Ao mesmo tempo, a massa de agudos, crônicos e cronificados que são realmente os sujeitos que ocupam os serviços de saúde mental PUBLICOS voltam a invisibilidade. Por outro lado, as experiências privadas em relação a "contenção e cura de doenças mentais" aparecem milagrosamente como exemplos de eficiência e eficácia - exatamente nesses termos.
5) A ABP ganha fôlego, recurso e espaço entre seus já pares e anuncia, depois de tentativas pontuais de desestruturação das conquistas da Lei da Reforma Psiquiátrica (2001), um enorme REVOGAÇO. Um projeto de revisão estrutural de todo o modelo assistencial, leis financiamento e direitos disponíveis às pessoas em sofrimento. Em contrapartida, oferece em paralelo o projeto de Lei da PSICOFOBIA, capturando a complexidade política que envolve a temática da manicomialidade, e seus sujeitos, e resumindo de forma simplificada em termos exclusivos de estigma. O direcionamento é a judicialização, com vistas a criminalização do ato de estigmatizar "o doente mental".
Pois bem...
O deslocamento do debate da manicomialidade para a dimensão exclusiva do estigma, de muitas formas captura a extensa gama de questões políticas que atravessam a saúde mental e seus sujeitos. Resume a questão no âmbito do preconceito, neutralizando a problemática de primeira ordem da Luta Antimanicomial, que é a afirmação da diferença, de outras estéticas da existência, modos de Ser e viver, no sentido de uma transformação do lugar social da loucura, para que rumemos para outros modos e mundos possíveis de existir. Esta situação abre na arena pública um largo espaço para um progressismo conservador que retoma e refocaliza a Saúde Mental em termos de Doença Mental (termo inclusive deslocado da linguagem instituída pela legislação atual e suas portarias normativas), estritamente biomédico, onde a politização do debate flerta com uma forma neoliberal de política de identidade, muito mais afeita ao individualismo e ao direito universal ao consumo de direios, do que a potência de vida da/na diferença, e para a diferença.
É o Paradigma Psiquiátrico XXI: uma alegoria revisionista que transita na linguagem contemporânea, articulando conceitos antimanicomiais de forma descontextualizada, desconectados de seus nexos teóricos e profundamente banalizados, para tentar figurar uma espécie "progressista" de Reforma Psiquiátrica à direita, que, a bem da verdade, opera fundamentalmente para sanitização social e impulsionamento da margem de acumulação do capital do complexo medico-financeiro-industrial, via medicalização.
Limitações da psiquiatria biomédica Controvérsia entre psiquiatras farmacológicos e reforma psiquiátrica Psiquiatria não comercial e íntegra Suporte para desmame de drogas psiquiátricas Concepções psicossociais Gerenciamento de benefícios/riscos dos psicoativos Acessibilidade para Deficiência psicossocial Psiquiatria com senso crítico Temas em Saúde Mental Prevenção quaternária Consumo informado Decisão compartilhada Autonomia "Movimento" de ex-usuários Alta psiquiátrica Justiça epistêmica
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