"A mística cerebral tem uma importância
particular para a forma como nossa sociedade lida com o problema da
doença mental. Isso em função do esforço generalizado de redefinir as
doenças mentais como distúrbios cerebrais. Seus proponentes argumentam
que tal redefinição posiciona os problemas psicológicos na mesma
categoria que a gripe ou o câncer - doenças que não evocam o estigma
social comumente associado aos transtornos psiquiátricos. E de fato
existem algumas evidências de que usar a linguagem dos distúrbios
cerebrais contribui para a redução de barreiras para que os pacientes
com problemas mentais procurem tratamento, um benefício importante.
Em
outros aspectos, no entanto, a reclassificação de doenças mentais como
distúrbios cerebrais pode ser altamente problemática. Para os pacientes,
atribuir problemas mentais a defeitos neurológicos intrínsecos implica
em uma auto-estigmatização. Embora pessoas com "cérebros quebrados" não
possam ser responsabilizadas moralmente ou instruídas a "simplesmente
superar isso", a compreensão de que elas são irremediavelmente
defeituosas pode ser igualmente prejudicial. Falhas biológicas podem ser
mais difíceis de consertar do que lapsos morais, e pessoas com
disfunção cerebral podem ser vistas como perigosas ou até mesmo como
menos humanas. Essa atitude chegou a extremos com os nazistas, que
assassinaram milhares de pacientes com problemas mentais como parte de
seu programa de "eutanásia" durante a Segunda Guerra Mundial, mas
persiste de formas mais sutis atualmente. Uma grande análise realizada em 2012 a respeito das
mudanças de atitude com relação à doença mental constatou que não houve
um aumento na aceitação social de pacientes com depressão ou
esquizofrenia, apesar da crescente conscientização a respeito das
contribuições neurobiológicas para tais condições.
Independentemente de suas implicações sociais, culpar o cérebro pelas doenças mentais pode ser cientificamente impreciso em muitos casos. Embora todos os problemas mentais envolvam o cérebro, os fatores causais subjacentes podem estar em outro lugar. No século XIX, a sífilis, doença bacteriana sexualmente transmissível, e a pelagra, doença relacionada à deficiência de vitamina B, estavam dentre as maiores causadoras de internação nos asilos para insanos na Europa e nos EUA. Um estudo mais recente estimou que cerca de 20% dos pacientes psiquiátricos têm alguma doença corporal que pode estar produzindo ou piorando sua condição mental; tais doenças incluem problemas cardíacos, pulmonares e endócrinos, que geram importantes efeitos cognitivos adversos. Pesquisas epidemiológicas descobriram correlações consideráveis entre a incidência de doenças mentais e fatores como o pertencimento a uma minoria étnica, nascimento em uma determinada cidade e nascimento em certas épocas do ano. Embora estas correlações não tenham sido bem explicadas, elas enfatizam o provável papel dos fatores ambientais, para muito além do cérebro, no desenvolvimento dos problemas psiquiátricos. Nós devemos ser sensíveis a esses fatores se quisermos tratamentos e prevenções mais efetivas para os transtornos mentais.
Independentemente de suas implicações sociais, culpar o cérebro pelas doenças mentais pode ser cientificamente impreciso em muitos casos. Embora todos os problemas mentais envolvam o cérebro, os fatores causais subjacentes podem estar em outro lugar. No século XIX, a sífilis, doença bacteriana sexualmente transmissível, e a pelagra, doença relacionada à deficiência de vitamina B, estavam dentre as maiores causadoras de internação nos asilos para insanos na Europa e nos EUA. Um estudo mais recente estimou que cerca de 20% dos pacientes psiquiátricos têm alguma doença corporal que pode estar produzindo ou piorando sua condição mental; tais doenças incluem problemas cardíacos, pulmonares e endócrinos, que geram importantes efeitos cognitivos adversos. Pesquisas epidemiológicas descobriram correlações consideráveis entre a incidência de doenças mentais e fatores como o pertencimento a uma minoria étnica, nascimento em uma determinada cidade e nascimento em certas épocas do ano. Embora estas correlações não tenham sido bem explicadas, elas enfatizam o provável papel dos fatores ambientais, para muito além do cérebro, no desenvolvimento dos problemas psiquiátricos. Nós devemos ser sensíveis a esses fatores se quisermos tratamentos e prevenções mais efetivas para os transtornos mentais.
Em
um nível ainda mais profundo, as convenções culturais circunscrevem a
noção de doença mental. Há apenas 50 anos, a homossexualidade era
classificada como uma patologia no manual oficial dos transtornos
mentais da Associação Psiquiátrica Americana (APA). Na Rússia soviética,
os dissidentes políticos algumas vezes eram internados com base em
diagnósticos psiquiátricos que chocariam a maioria dos observadores
atuais. No entanto, a preferência sexual ou a incapacidade de se curvar a
uma autoridade na luta por uma causa virtuosa são ambos traços
psicológicos para os quais eventualmente poderíamos encontrar certos
correlatos biológicos. Isso não significa que a homossexualidade e a
dissidência política sejam doenças cerebrais. É a sociedade, e não a
neurobiologia, que define, no fim das contas, os limites da normalidade
que determinam as categorias psiquiátricas [mental-health categories]. "
Nenhum comentário:
Postar um comentário