Pacientes produtores ativos de saúde (prosumo)

Essa avalanche de informações e conhecimento relacionada à saúde e despejada todos os dias sobre os indivíduos sem a menor cerimônia varia muito em termos de objetividade e credibilidade. Porém, é preciso admitir que ela consegue atrair cada vez mais a atenção pública para assuntos de saúde - e muda o relacionamento tradicional entre médicos e pacientes, encorajando os últimos a exercer uma atitude mais participativa na relação. Ironicamente, enquanto os pacientes conquistam mais acesso às informações sobre saúde, os médicos têm cada vez menos tempo para estudar as últimas descobertas científicas ou para ler publicações da área - on-line ou não -, e mesmo para se comunicar adequadamente com especialistas de áreas relevantes e/ou com os próprios pacientes. Além disso, enquanto os médicos precisam dominar conhecimentos sobre as diferentes condições de saúde de um grande número de pacientes cujos rostos eles mal conseguem lembrar, um paciente instruído, com acesso à internet, pode, na verdade, ter lido uma pesquisa mais recente do que o médico sobre sua doença específica. Os pacientes chegam ao consultório com paginas impressas contendo o material que pesquisaram na internet, fotocópias de artigos da Physician's Desk Reference, ou recorte de outras revistas e anuários médicos. Eles fazem perguntas e não ficam mais reverenciando a figura do médico, com seu imaculado avental branco. Aqui as mudanças no relacionamento com os fundamentos profundos do tempo e conhecimento alteraram completamente a realidade médica. Livro: Riqueza Revolucionária - O significado da riqueza no futuro

Aviso!

Aviso! A maioria das drogas psiquiátricas pode causar reações de abstinência, incluindo reações emocionais e físicas com risco de vida. Portanto, não é apenas perigoso iniciar drogas psiquiátricas, também pode ser perigoso pará-las. Retirada de drogas psiquiátricas deve ser feita cuidadosamente sob supervisão clínica experiente. [Se possível] Os métodos para retirar-se com segurança das drogas psiquiátricas são discutidos no livro do Dr. Breggin: A abstinência de drogas psiquiátricas: um guia para prescritores, terapeutas, pacientes e suas famílias. Observação: Esse site pode aumentar bastante as chances do seu psiquiatra biológico piorar o seu prognóstico, sua família recorrer a internação psiquiátrica e serem prescritas injeções de depósito (duração maior). É mais indicado descontinuar drogas psicoativas com apoio da família e psiquiatra biológico ou pelo menos consentir a ingestão de cápsulas para não aumentar o custo do tratamento desnecessariamente. Observação 2: Esse blogue pode alimentar esperanças de que os familiares ou psiquiatras biológicos podem mudar e começar a ouvir os pacientes e se relacionarem de igual para igual e racionalmente. A mudança de familiares e psiquiatras biológicos é uma tarefa ingrata e provavelmente impossível. https://breggin.com/the-reform-work-of-peter-gotzsche-md/
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segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

Biologia, sociedade e ideologia

Imagine duas sociedades em que uma privilegia o certinho ou fechado com o sucesso e outra que privilegia o malandro e o aberto com o sucesso. Essas características seriam semelhantes a nichos sociais de obtenção de recursos. Os valores sociais sobre o que é produtivo nessas sociedades ou nichos são opostos. Numa sociedade um tipo faz sucesso e o outro tipo fracassa, inclusive econômicamente. Qual dos dois tipos tem características biológicas superiores? Isso seria relativo ao sucesso ou fracasso em cada tipo de sociedade com seus valores sociais. A partir disso, talvez fique mais claro o entendimento de que áreas biológicas sobre saúde mental pelo menos não são separáveis de fatores sociais como se fossem biologia pura. Fica mais claro também que aspectos biológicos e sociais tem interrelação mútua em suas consequências. Por isso, uma área de conhecimento que se diz pura está sendo ideológica de forma não transparente e sub-reptícia.

terça-feira, 5 de novembro de 2024

Liberdade, determinantes e reforma psiquiátrica

A questão da dificuldade de apoio público aos equipamentos de álcool e drogas da reforma psiquiátrica está relacionado com a simplicidade que envolve o modelo de coerção manicomial, a percepção de que louco e drogado não tem real liberdade ou capacidade de liberdade e a ausência de uma resposta na reforma psiquiátrica dentro de uma base naturalista de explicação dos comportamentos. Intuitivamente, a grande maioria das pessoas entende que a noção de determinantes, mesmo que de forma paternalista, do comportamento tem validade maior do que a liberdade para pessoas em situação precária ou a todo custo. A direita e o modelo manicomial obtém influência política porque esse reconhecimento dos determinantes, apesar de serem modelos precários de influência sobre o comportamento, obtém ganhos segundo a sociedade ou evita riscos percebidos pela sociedade. Se as leis sociais e biológicas conservadoras não forem substituídas por propostas de maior qualidade e sofisticação de forma que inclua a diversidade de valores e preocupações sociais a reforma psiquiátrica dificilmente vai obter apoio além dos gabinetes políticos e de gestão da saúde.

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Tradição, conformidade, neutralidade e estabilidade

Tradição e conformidade são formas de aparentar neutralidade. Humor, comportamento, identidade e pensamento neutro são formas de aparentar naturalidade em relação ao modo como as coisas são. Logo, a estabilidade como critério de saúde mental implica em "não posicionamento", não intensidade, ou na verdade formas de adequar-se aparentando naturalidade.

sexta-feira, 17 de maio de 2024

Reforma psiquiátrica: comunidades multiculturais versus incorporação

A reforma psiquiátrica e luta antimanicomial analisada do ponto de vista sociopolítico é a busca da criação de uma comunidade multicultural da loucura com subsídios públicos, um padrão de esquerda.

A crítica que se faz à adaptação é a rejeição da incorporação à sociedade majoritária por ser vista como opressora e excludente para pessoas diferentes (fobia ao diferente).

A concepção de direita da loucura é que deve ser corrigida para possibilitar incorporação na sociedade majoritária. Por isso a ênfase nos tratamentos biológicos. Uma vez que possa haver dificuldade de incorporação recorre a formas de lidar com a exclusão.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

Psiquiatrização e ideologia

O termo ou nomeação "loucura" expressa uma relação negativa de julgamento com a cultura. É uma categoria social que tanto pode ser utilizada de acordo com a tradição manicomial como também ser problematizada. O uso da palavra loucura pelas pessoas sem conhecimento em reforma psiquiátrica antimanicomial, ciências humanas e sociais induz pensar as causas dos fenômenos e medidas sociais em termos manicomiais, isto é, inclusão de fatos e informações em suas categorias de forma a reforçá-las mutuamente com a sua ideologia social e valores.

A área da história mostra como o conhecimento psiquiátrico é uma cientifização da marginalização e do preconceito. Quando se enfatiza a crítica social de que as minorias padecem de medicalização e patologização injusta, anteriormente a isso houve conquista de certa influência social desses grupos.

A produção social dos acontecimentos negativos se torna silenciada quando os mesmos são entendidos como fenômeno manicomial (individual, puramente orgânico). Isso é uma forma de ideologia pois tem funções sociais não explícitas úteis a certas pessoas e grupos com poder. Essas pessoas e grupos utilizam estratégias discursivas (conforme análise crítica do discurso) que induzem ocultar as características centrais dos acontecimentos em suas relações de determinação social, cultural, econômicas, políticas, históricas, etc. ("a medicalização atua na periferia do fenômeno"). A indústria da loucura é altamente lucrativa e uma de suas práticas é a difusão de estigmas contra pessoas facilmente atacáveis e sem influência social ou poder.


Para ler mais:

O espelho do mundo - Maria Clementina Pereira Cunha (livro)

História da psiquiatria no Brasil - Jurandir Freire Costa (livro)

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

Biologia/ciência e ideologia

A biologia enquanto biologia não é necessariamente ideológica ou política. Mas diferentes formas de ciência biológica ou outras formas de ciência podem ter usos sociais mais conservadores ou de esquerda. A motivação e o uso para uma forma de ciência faz parte do sistema social inteiro dessa forma de ciência (acoplamento com atores da sociedade). Inclusive há valores envolvidos que não são apenas os cognitivos (ver discussão ciência e valores). Esses sistemas sociais incluem valores econômicos, de gênero, sociais, políticos, etc.

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

Contenção, tratamento involuntário e concepções sociais

O uso da força nos hospitais contribui para manter a concepção de usuário da saúde mental perigoso, prática que não se vê necessidade nos CAPS.

O tratamento psicofarmacológico involuntário e para a vida toda contribui para manter a concepção social de transtorno crônico e sem cura, fonte de muito lucro para a indústria farmacêutica.

quarta-feira, 23 de junho de 2021

Ideologia e ciência psiquiátrica

Mesmo quando antigamente tinha pouco a oferecer cientificamente a psiquiatria tinha poder por cumprir a função ideológica de defesa da norma social (eficiência e produtividade? / pessoas com poder social?).

A psiquiatria continua fraca em termos científicos mas hoje em dia ela tem um verniz de cientificidade maior. Com esse verniz de cientificidade, a mistificação técnica atual também cumpre uma função ideológica de defesa da norma social. Mesmo com ciência melhor a psiquiatria crítica não tem tanto poder social acredito que por não ter o mesmo apelo ideológico. Parece que desmistificar a psiquiatria como ideológica seria colocar a norma social em escrutínio e defender ao invés disso os anormais. O que parece absurdo para muita gente.

(Uma tentativa de reescrever e se apropriar de algumas ideias de Basaglia.)

terça-feira, 22 de junho de 2021

Ideologia psiquiátrica, bode expiatório e psicoterapia

Basaglia defendia que a psiquiatria e suas categorias positivistas são ideologias (falsa consciência) e uma das finalidades dessa ideologia é exorcizar as contradições sociais e limitações da sociedade. Com isso, a pessoa diagnosticada se torna um bode expiatório da sociedade.

As teorias psicológicas evadem os problemas sociais reais e individualizam os problemas. Muitos clientes poderiam testemunhar sobre o vazio que pode ser uma psicoterapia, principalmente no caso da baixa produtividade das terapias em grupo.

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Liberdade - Tocqueville

 Nunca será dizer demais: não há nada mais fecundo em maravilhas do que a arte de ser livre;

mas não há nada mais difícil do que o aprendizado da liberdade. 


Tocqueville -  Democracia na América.

segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Trabalho, feminismo e pacientes psiquiátricos

O movimento feminista difundiu a ideia de que o trabalho é ou deve ser algo emocionalmente satisfatório, uma forma de poder e um privilégio. Se o trabalho fosse emocionalmente satisfatório e conferisse poder a pessoa não precisaria ser paga para trabalhar Se os pacientes psiquiátricos não consideram emocionalmente satisfatório trabalhar ou não trabalham de forma tranquila em ambientes de trabalho que são por definição hostis pela própria natureza do trabalho eles são considerados doentes ou incapazes por psiquiatras ou por si mesmos.
 
Ler mais: O mito do poder masculino. 
Autor: Warren Farrell


segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Comportamento politicamente indesejável

O conceito da análise comportamental do direito de que o comportamento indesejável é decidido politicamente me parece ser a base de toda a problemática da loucura. Um indivíduo é considerado louco para ser fragilizado politicamente, não poder mais defender os próprios interesses ou perspectivas de forma legitimada. A partir disso, se entende como e porque se usa a loucura como argumento: favorecer a perspectiva ou interesse particular e situacional de uma pessoa em detrimento da perspectiva ou interesse da outra pessoa fragilizada. É possível concluir que a reforma psiquiátrica é a problematização dessa política de fragilização de pessoas. Também torna possível entender porque a família, os psiquiatras e sociedade tende a não jogar contra a própria perspectiva para defender direitos, perspectivas e interesses dos chamados "loucos". Inclusive permite perceber como a palavra loucura e os rótulos de diagnósticos psiquiátricos são um instrumento social de fragilização que deveria ser evitado porque deixa de problematizar de forma legítima os embates sociais e os fecha/finaliza em uma relação de poder assimétrica. Também permite entender as razões políticas do sucesso dos "normais" ou a alta preferência por imitar os comuns e majoritários. Ou o fracasso social dos chamados "loucos", inclusive por meio de sabotagem e competição com os "normais". Quando alguém é diagnosticado ou chamado de louco isso é uma tentativa de ganhar ou finalizar um embate social e ensurdecer-se contra os argumentos do outro lado. A autocrítica que falta aos "normais" e psiquiatras/profissionais psi se origina da defesa das próprias perspectivas e interesses. A sociedade majoritária se une com as profissões psi para fragilizar aquilo que considera indesejável e isso é decidido politicamente. Se é decidido politicamente há um embate aberto e legítimo a ser feito.

segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Mídia e corporações

 A imagem pode conter: texto que diz "0 propósito da mídia não é de informar o que acontece... ...mas sim de moldar a opinião publica de acordo com a vontade do poder corporativo dominante. NOAM CHOMSKY"

Caridade prejudicial / incapacidade / socialismo

Caridade. A inerente coercitividade da competição está sufi-

cientemente clara. Um resultado de competitividade desenfreada é o

nosso mundo partido em possuidores e despossuídos, uma estrutu-

ra que agora se prova instável. A caridade institucionalizada e priva-

da e as "redes de segurança" governamentais tentam prover níveis

mínimos de apoio para os mais severamente privados, mas eles nem

impediram o alargamento da lacuna econômica nem reduziram a

ameaça de instabilidade social.

Uma solução muito defendida para o problema de uma socie-

dade dividida em dois é impor a igualdade por meio da redistribui-

ção de toda a riqueza e recursos. Esta proposta toma uma de duas

formas, ambas coercitivas: uma é simplesmente tomar todas as pos-

ses das duas metades e dividi-las entre os despossuídos; a outra é a

pesada taxação pelo governo, o suficiente para prover estabilidade

para todos. Aqueles que exigem uma destas soluções não as pensa-

ram até seus resultados finais.

Redirecionar o desequilíbrio atual confiscando e redistribuin-

do, embora possa apelar para o sentido de justiça de alguns, não

produzirá estabilidade. Dada a continuidade da competitividade,

apenas veríamos ciclos repetitivos de concentração e subseqüente

redistribuição forçada de riqueza. Quais são as contingências aqui?

Vencer, embora seja recompensado de início, é finalmente punido;

perder, embora punido de início, é finalmente recompensado. Uma

conseqüência destas contingências serão ondas crescentes de opressão severa

crescente por parte daqueles que ganharam tudo e desejam mantê-lo e

contramedidas crescentemente violentas por parte daqueles que nada têm a

perder.

Tais ciclos de ganho e perda, perda e ganho simplesmente manteriam

eternamente os grupos em disputa, primeiro um dominando e, então, o outro.

Quão freqüentemente vimos este processo se repetindo no terreno da

propriedade? O governo se apropria de toda a terra e a devolve para "o

povo" — os pequenos agricultores. Não demora muito e alguns agricultores

ganharam tudo para si e mais uma vez o governo e os ricos experienciam

ataques violentos de proponentes revolucionários da reforma agrária.

Podemos ver um processo semelhante se iniciando em nossas cidades, onde

a falta de moradia popular está levando governos locais a impor pressões

confiscatórias contra proprietários de terra. A ferramenta coercitiva produzirá

apenas uma nova geração de monopolistas, aqueles que pegaram as menores

parcelas e a juntam novamente para seu próprio beneficio.

A política governamental de bem-estar, que pretende eliminar pelo

menos os extremos de riqueza e pobreza, acabará em uma sociedade dividida

em dois de um outro tipo, não mais satisfatória e produtiva e provavelmente

não mais estável que a atual. Já podemos ver os primeiros resultados da

segurança econômica, habitacional e de saúde que é provida

independentemente de qualquer coisa que o indivíduo faça ou deixe de fazer

— o que quer dizer, sem relação contingente entre conduta e conseqüência.

O que se supõe vir a ser uma sociedade sem classes está a meio caminho de

tornar-se uma nova estrutura de dois níveis, hospedeiro e parasita,

freqüentemente visto na natureza, mas raro, em grande escala, entre humanos.

Isto não é um julgamento de valor, nem um ataque ao liberalismo (nome do esquerdismo nos EUA). 

É uma conclusão que a análise do comportamento torna inevitável. Um estado

de bem-estar viola a primeira lei da conduta: o que as pessoas fazem é ditado

pêlo que acontece. Naturalmente, outros fatores modulam esta primeira lei;

conseqüências não agem isoladamente. Mas, é freqüentemente revelador

examinar projeções que não reconhecem como fontes de interferência os

processos básicos de reforçamento. Tais análises podem ser úteis por nos

mostrar para onde nos dirigimos se não modificarmos as contingências.

N o futuro , sem intervenção , quais são os dois níveis a serem

esperados do compartilhar não-contingente de todos os recursos da

comunidade e como surairão estes dois níveis? Um lado da socieda

de do bem-estar conterá produtores, ou outro, parasitas. Pessoas da

classe trabalhadora irão se engajar interativamente em seu ambien-

te, mudando-o, deixando nele sua marca, construindo repertórios de

conduta variados em resposta às contingências naturais e sociais;

os trabalhadores levarão vidas produtivas e potencialmente satisfa-

tórias. Aqueles da classe de parasitas receberão tudo em troca de

nada, recostados com suas bocas abertas à espera de alimento, não

interagindo com e, até mesmo, alienados de seus ambientes; os

parasitas permanecerão infantis e não-produtivos. Este bem conhe-

cido problema familiar, a criança mimada, há de se generalizar para

toda uma sociedade.

Parasitas, com suas necessidades básicas satisfeitas, têm

pouco incentivo para mudar. Por que ser um produtor quando ou-

tros estão dispostos a fazê-lo por você? Por quanto tempo os produ-

tores vão se manter produtivos nestas circunstâncias? Por quanto

tempo vão se manter dispostos a dividir, quando virem os frutos de

seu trabalho desviado para aqueles que os obtêm simplesmente pa-

rando e esperando? A relação é inerentemente instável.

Problemas que se originam de acesso desigual aos recursos

do mundo não serão resolvidos aplicando-se medidas cada vez mais

severas para manter os despossuídos em seu lugar ou, simplesmen-

te, entregando-lhes uma parte. Ambas as soluções abordam o pro-

blema ao contrário, tentando impedir contra-reações, seja eliminan-

do os despossuídos, seja reforçando a passividade. Vimos que tenta-

tivas para eliminar comportamento são finalmente autoderrotadas.

Caridade não-contingente pode ser igualmente devastadora, tornan-

do doadores em hipócritas e recebedores em seres vegetativos.

A satisfação de nossas necessidades independentemente do

que quer que seja que façamos ou deixemos de fazer tornar-nos-á

essencialmente sem comportamento. Contingências ambientais ge-

ram novo comportamento; quando nossos atos produzem conse-

qüências, nós aprendemos. Quando essas conseqüências vêm inde-

pendentemente do que quer que seja que façamos ou deixemos de

fazer, nós ou não conseguimos aprender ou aprendemos, na realida-

de, a fazer nada.

Embora seja sensato e, freqüentemente, satisfatório compar-

tilhar os frutos do sucesso com os menos afortunados, está longe de

ser càritativo tornar este compartilhar não-contingente. Doar cega-

mente, em nome do humanitarismo, garante que aqueles que preci-

sam de caridade porque não têm capacidades produtivas manter-se-

ão incapazes. Não importa quão desagradável consideremos a noção

de controlar os outros por meio de doação contingente, nós os con-

trolamos de qualquer modo—inadvertidamente, mas da mesma forma efetivamente

—por meio de caridade que não está relacionada a qualquer coisa que eles aprendam

ou consigam fazer. A caridade não-contingente produz e perpetua a pobreza.

Portanto, a caridade em si mesma não prove solução para os problemas

que a coerção competitiva coloca. Manter as pessoas sem comportamento não é

um favor para elas, as destrói. Uma classe social definida por incompetência e

ignorância, com a conseqüente inabilidade de seus membros para deixar essa classe

ou mesmo para se sustentarem a si mesmos dentro dela, finalmente tornará o

restante da sociedade ressentido. Tendo sido forçados, em nome da humanidade, a

se manterem no mesmo estado que os torna objetos de caridade, eles finalmente se

tornam alvo de hostilidade e repressão.


Coerção e suas implicações - Sidman

domingo, 30 de agosto de 2020

Consciência forte, conservadorismo e rejeição da singularidade/criatividade

Assim como o animal de laboratório, que gasta todo seu tem-
po esquivando-se de choques, pessoas que têm uma consciência forte
podem andar em um curso estreito. Elas obedientemente fazem o
que é esperado, raramente tentando algo novo. Elas são confiáveis,
corajosas, transparentes e reverentes. Junto com estas inquestioná-
veis virtudes pessoais, entretanto, elas freqüentemente consideram
criatividade uma coisa perigosa, desaprovando-a em si mesmas e nos
outros. Elas freqüentemente consideram a singularidade perturbadora;
ação, crença ou aparência não-convencionais ameaçam sua seguran-
ça. E quando as condições mudam, quando a sociedade relaxa algu-
mas contingências e estreita outras, elas freqüentemente são incapa-
zes de adaptar-se; mudanças as ultrapassam. Estes subprodutos
infelizes de coerção "efetiva" também devem ser esperados quando a
comunidade constrói consciências individuais por meio de punição.

Se frutos proibidos continuam a nos atrair, a comunidade
haverá de nos considerar como tendo consciência fraca e sendo,
portanto, perigosos. Mesmo sem burlar a lei, podemos nos descobrir
com problemas. Simplesmente adotar um estilo de vida incomum
pode nos colocar em conflito com a comunidade mais ampla; ela
considera o diferente como não-confiável. Também podemos nos
sentir em guerra conosco quando somos fortemente tentados a fazer
coisas que aprendemos a chamar de "ruins" ou "perigosas", ou
quando nos descobrimos realmente "indo contra nossa consciência".
Não apenas a comunidade deixa de confiar em nós porque não
podemos nos controlar, mas é provável que não confiemos ou que
desprezemos a nós mesmos. Estas características distintivas de de-
sordens de personalidade e de neuroses são subprodutos adicionais
das práticas coercitivas que a comunidade usa para estabelecer a
consciência individual.

Coerção e suas implicações - Sidman

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Culto à perfomance

[É necessário se adaptar às ideologias]


 O objetivo do livro é explicar que o culto à performance é uma

maneira de enfrentarmos as transformações ocorridas na noção

de igualdade. Em outras palavras: toda sociedade democrática

possui princípios para resolver a contradição entre o justo e o

injusto, entre igualdade de princípios e desigualdades reais: de

oportunidades, de renda e de acesso ao poder. A sociedade fran-

cesa do pós-guerra, por exemplo, baseava-se em um modelo de

igualdade que opunha concorrência e justiça, ou seja, era uma

sociedade que buscava limitar as conseqüências negativas da

concorrência, preservando a justiça na distribuição de recom-

pensas e sanções. No entanto, ao longo da década de 1980, a

sociedade francesa se converteu aos valores da concorrência, da

competição e da conquista. Esportistas, aventureiros, inventores,

profissionais autônomos, trabalhadores abrindo suas próprias

empresas e outros “combatentes” tornam-se figuras populares.

Um novo modelo de igualdade apareceu, um que fazia com que

o que era considerado “justo” era um produto direto da concor-

rência. Pois é exatamente isso que representa a competição es-

portiva: ela é a única atividade social que encena a união har-

moniosa da concorrência com a justiça. Ela é a própria imagem do

que é uma igualdade justa. Roberto da Matta mostrou muito bem

isso em relação ao futebol no Brasil. Os novos objetos de identifi-

cação e as novas normas tinham como elemento comum o fato de

que saímos do mundo da disciplina para entrar no da autonomia.


Hoje, empreender se tornou o único modelo de conduta possí-

vel. Em contrapartida, as desigualdades se mantêm, embora te-

nham mudado de estilo e de formato. Há hoje um novo debate

sobre as desigualdades, pois em um mundo que promete, antes

de qualquer coisa, o sucesso individual, as desigualdades são

cada vez mais encaradas como uma falha pessoal. As expectati-

vas aumentaram, mas não as possibilidades de realizá-las. Na

prática, sabemos que a realidade da vida social não funciona

com base em uma concorrência justa.

http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/gvexecutivo/article/download/34605/33411

terça-feira, 14 de julho de 2020

Normalidade como discurso ideológico

O discurso da normalidade é um discurso ideológico no sentido de favorecer interesses de grupos dominantes ou que querem tirar alguma vantagem. Se ajustar à ideologia traz muitas vantagens, não é algo de consequências ruins. Mas é preciso levar em consideração que o discurso da normalidade não necessariamente serve à própria pessoa à quem se exige que adote posturas adequadas (às exigências de um grupo de pessoas).

sábado, 11 de julho de 2020

Liberdade e família: questão complicada

https://www.libertarianism.org/topics/family

A questão dos direitos dos pais é particularmente irritante para os libertários. Claramente, a doutrina libertária sugere que os pais devem ter o direito de tomar decisões sobre seus filhos, em vez de outros adultos ou o estado. Nos Estados Unidos, a jurisprudência constitucional tem, desde a década de 1920 (em Meyer vs. Nebraska e Pierce vs. Society of Sisters), amplamente sustentado esse princípio como uma questão de devido processo legal sob a 14ª Emenda. Ao mesmo tempo, também reconheceu argumentos centrados no "melhor interesse da criança" em 1944 em Prince v. Massachusetts. Reconhecer a primazia dos direitos dos pais, no entanto, levanta mais perguntas do que respostas; não nos diz em que ponto as crianças são "adultas o suficiente" para começar a tomar suas próprias decisões, independentemente das preferências dos pais, nem em que momento o exercício dos direitos dos pais transborda em abusos e negligências que podem justificar a intervenção do Estado ou de outros. .

Com relação à primeira pergunta, uma minoria de libertários defende fortemente os direitos das crianças e acredita que elas devem poder tomar mais decisões mais cedo do que se pensa. Se essa perspectiva é simplesmente parte de uma filosofia de criação de filhos ou de uma declaração política sobre os direitos individuais das crianças nem sempre é claro. Os libertários não têm uma resposta clara à questão da negligência. No entanto, na medida em que libertários adotam a visão de que o ônus da prova para a intervenção nos assuntos dos indivíduos recai sobre o Estado, segue-se que há uma presunção de que os pais têm tanto conhecimento quanto incentivo para fazer o que é certo para seus filhos. Além disso, o Estado deve demonstrar que, ao submeter as crianças a suas ações, não trará uma situação pior do que a obtida em casa. Assim como a existência de imperfeições no mercado não significa ipso facto, a intervenção estatal melhorará sobre elas, nem uma família imperfeita significa que a interferência nos direitos dos pais, especialmente removendo os filhos de uma casa, levará a uma melhoria na vida das pessoas. crianças. Também deve ficar claro que as reivindicações de "privacidade da família" (distintas dos "direitos dos pais") que nas gerações anteriores permitiram que os homens usassem a violência, incluindo o estupro, como uma maneira de "controlar" suas esposas, são totalmente contraditórias ao libertarianismo, na medida em que nenhum entendimento razoável do contrato de casamento possa anular a proibição libertária de iniciar a força física ou a ameaça dela contra adultos competentes.

O libertarianismo baseia-se na premissa de que o comportamento consensual entre adultos deve estar livre de interferências de outros. No entanto, essa visão é complicada pelo que constitui “consentimento” e “idade adulta”, que são desafiados pela presença de crianças e pela natureza dos entendimentos tácitos que compõem os relacionamentos familiares. Essas perguntas não se prestam a soluções simples e fornecem áreas contínuas de debate entre os libertários que as abordam. Dito isso, os libertários geralmente concordam que o estado deve permanecer ausente ou neutro no tratamento da multiplicidade de formas familiares que os humanos podem desenvolver e manter e que, quando se trata de questões de abuso e negligência, o ônus da prova está no estado. mostrar que a interferência nos direitos dos pais é justificada e que a solução alternativa é superior ao status quo.


terça-feira, 30 de junho de 2020

Positividade como ideologia (Marcuse)

Trechos:

A comunicação funcional é apenas a camada externa do universo unidimensional, no qual o homem é treinado para esquecer - para traduzir o negativo em positivo de modo a poder continuar funcionando, reduzido, mas adequado, e razoavelmente bem.

A Consciência Feliz - a crença em que o real seja racional e em que o sistema entrega as mercadorias - reflete o novo conformismo, que é uma faceta da racionalidade tecnológica traduzida em comportamento social. O conformismo é novo porque é racional em grau sem precedente. Sustenta uma sociedade que reduziu - e em seus setores mais avançados eliminou - a irracionalidade mais primitiva das fases precedentes, que prolonga e aprimora a vida mais regularmente do que nunca. 

O poder sobre o homem, adquirido por essa sociedade, é diariamente absolvido por sua eficácia e produtividade. Se ela assimila tudo o que toca, se absorve a oposição, se brinca com a contradição, demonstra sua superioridade cultural. E, do mesmo modo, a destruição de recursos e a proliferação do desperdício demonstram sua opulência e o "alto nível de bem-estar"; "a Comunidade vai demasiado bem para que nos preocupemos com ela!"

Tal relação dialética de opostos na proposição, e por ela, é possibilitada pelo reconhecimento do sujeito como agente histórico cuja identidade se constitui na prática histórica e contra esta, em sua realidade social e contra ela. A locução se desenvolve e enuncia o conflito entre a coisa e sua função, e esse conflito encontra expressão linguística em sentenças que unem predicados contraditórios numa unidade lógica - similar conceptual da realidade objetiva, Em contraste com toda a linguagem orwelliana, a contradição é demonstrada, explicitada, explicada e denunciada. 

A linguagem rito-autoritária se dissemina pelo mundo contemporâneo, pelos países democratas e não-democratas, capitalistas e não-capitalistas. 2: . Segundo Barthes, é a linguagem "propre a tous les regimes d'autorité (própria a todos os regimes de autoridade) , estará presente, hoje em dia, na órbita da civilização industrial avançada, uma sociedade que não está sob regime autoritário? Visto que a substância dos vários regimes não mais aparece em formas alternativas de vida, repousa em técnicas alternativas de manipulação e controle. A linguagem apenas reflete esses controles mas torna-se, ela própria, um instrumento de controle até mesmo onde não transmite ordens, mas informação; onde não exige obediência, mas escolha, onde não exige submissão, mas liberdade. Essa linguagem controla reduzindo as formas linguísticas e dos símbolos de reflexão, abstração, desenvolvimento, contradição; substituindo conceitos por imagens. Nega ou absorve o vocabulário transcendente; não investiga, estabelece e impõe a verdade e a falsidade. Mas esse tipo de locução não é terrorista. Parece arriscado supor que os receptores acreditam ou sejam levados a acreditar no que lhes é dito. O novo toque da linguagem mágico-ritual é, antes, o de as pessoas não acreditarem nela ou não se importarem com ela, mas, não obstante, agirem em concordância com ela. Não se "acredita" no enunciado de  um conceito operacional, mas este se justifica em ação - em realizar o trabalho, em vender ou comprar, na negativa de ouvir os outros etc. 

Livro: A IDEOLOGIA DA SOCIEDADE INDUSTRIAL 
Autor: HERBERT MARCUSE 

sábado, 25 de abril de 2020

Ideologia, análise do discurso e reforma psiquiátrica

Segundo a análise do discurso e a sociologia do conhecimento todo grupo é ideológico, isto é, adota discursos que defendem interesses de grupo. A diferença é se essa defesa do interesse de grupo também beneficia a sociedade de verdade ou se usa de estratégias discursivas de defesa do próprio interesse como se fosse a defesa do interesse da sociedade.

A partir disso é possível refletir se os interesses financeiros ligado à Associação Brasileira de Psiquiatria (indústria farmacêutica, hospitais, serviços médicos e equipamentos) também se reflete em benefícios sociais ou se a defesa da reforma psiquiátrica como política pública beneficia só os funcionários públicos da saúde e os políticos de esquerda ou se defende também o interesse público.