"A lógica de Giovanna M. é linear: quanto mais exames eu fizer, mais dados sobre meu estado de saúde eu terei à disposição e, portanto, mais condições de evitar eventuais doenças. Assim viverei mais. O melhor tratamento é fazer todo o possível. Essa senhora não sabe que para todos os exames há uma cota de resultados falsamente positivos (o exame é positivo mesmo que o sujeito não tenha uma doença) e falsamente negativos (o exame é negativo mesmo na presença de uma doença). O que implica tudo isso? No primeiro caso, o paciente será submetido a outras investigações ou tratamentos totalmente inúteis; no segundo, no entanto, será erroneamente tranquilizado.
A lógica da medicina atual é igualmente linear: quanto mais indivíduos um médico convencer da precariedade de seu bem-estar, mais aumentarão as necessidades, os "clientes" e os negócios.
O mecanismo cruel da medicina atual é este: para ampliar o mercado e acumular recursos econômicos para investir em pesquisa, não podemos nos limitar a tratar os verdadeiros doentes, precisamos também tratar aqueles que estão ainda pouco doentes e aqueles que talvez (mas não com certeza) adoecerão. Assim, criam-se novas doenças. O médico, sempre a par da última novidade, estará orgulhoso de ter formulado o diagnóstico, e o paciente estará satisfeito de sair do consultório com uma prescrição. Agora, seus incômodos têm um nome e uma terapia. Seja como for, enquanto existirem novos clientes, ansiosos para serem tratados, aumentará cada vez mais a multidão de pessoas angustiadas, prontas para solicitar assistência médica. Se um eventual risco for percebido como uma doença que pode ser diagnosticada e tratada, a medicina não terá limite para cuidar também dos não doentes.
Como epígrafe, Meador cita uma frase de A. J. Barsky, um psiquiatra de Boston:
"Deve haver algo errado, se uma pessoa, quando não tem problemas, vai consultar-se com um médico". É esse o progresso da medicina que queremos? Estamos tão bem, somos tão bem tratados que nos sentimos todos doentes? Têm a impressão de que a saúde pode ser conquistada somente por um estados de enfermidade perene. É melhor flagelar-se com medicamentos, dietas, controles, exercícios e renúncias na esperança de obter um benefício, mesmo sabendo que dificilmente nossos esforços reduzirão o risco de contrairmos de uma doença e distanciarão o momento da morte? Ninguém poderá nos dizer como viveremos os anos que ganhamos com prevenção ou tratamentos eficazes: em perfeita saúde, rodeados pelo afeto de nossos entes queridos, ou em uma cama, assistidos por um cuidador indolente?
Do livro: O doente imaginado
Autor: Marco Bobbio
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