Em sua formulação do conceito de biolegitimidade, Didier Fassin parte da constatação de que o direito à vida se tornou prioritário na pauta dos direitos humanos, em relação aos direitos sociais e econômicos. Fassin situa e problematiza a potência moral desse “direito à vida” (expresso no artigo 3 o da Declaração dos Direitos Humanos de 1948), contraposta a uma crescente “debilidade moral” dos direitos sociais e econômicos (previstos no artigo 22 da mesma Declaração), como uma contingência histórica e contemporânea. Desse modo, haveria uma inversão de prioridades no campo político e moral contemporâneo, em que o direito à vida se tornaria mais importante que os direitos sociais e econômicos e se imporia inclusive em detrimento destes. Essa diferença entre as duas perspectivas ele denomina de “conflito de duas comunidades éticas que têm uma legitimidade desigual” (FASSIN, 2010, p. 193).
A questão central para o autor é que “a vida humana se tornou o valor mais legítimo sobre o qual o mundo contemporâneo fundamenta o pensamento dos direitos humanos” (FASSIN, 2010, p. 201).
Considero o conceito de biolegitimidade particularmente útil para pensar sobre alguns aspectos das políticas sociais no Brasil e sobre os modos como o Estado se coloca frente às demandas sociais e sobre como as demandas sociais incorporam essas novas formas de legitimação. Entre alguns exemplos ligados às pesquisas que venho coordenando ou orientando, cabe citar o alargamento dos campos do patológico e da medicamentalização no contexto das políticas de saúde mental e da Reforma Psiquiátrica no Brasil.
No texto Biolegitimidade, direitos e políticas sociais: novos regimes biopolíticos no campo da saúde mental no Brasil 1 (antropologia)
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