SM – O conflito de interesses na relação
instituições/pesquisadores/indústria pode ser superado? De que forma? Os
médicos têm força suficiente para não sucumbir ao assédio dos
laboratórios? Um dos argumentos usados para justificar eventual
dependência é que “as companhias propiciam educação médica continuada”.
Angell – Laboratórios
farmacêuticos não deveriam participar da “educação” de médicos, pois
não se espera que forneçam informações objetivas a respeito de produtos
comercializados por eles próprios. Ou seja, cabe à profissão médica a
responsabilidade pela sua própria educação. Para que as coisas
caminhassem de maneira imparcial, penso que o patrocinador das pesquisas
em universidades deveria ficar absolutamente fora dos estudos, o que
significa não opinar nos desenhos, não tomar parte na análise dos dados
ou na elaboração de artigos. Além disso, pesquisadores não poderiam ter
outros vínculos financeiros, como aquele que os obriga a prestar
consultorias patrocinadas pelos laboratórios financiadores de remédios.
Finalmente, em suas práticas, os médicos não deveriam aceitar brindes da
indústria farmacêutica. Nem mesmo os considerados insignificantes, pois
a literatura mostra que, mesmo pequenos presentes, especialmente
aqueles dados aos médicos em formação, criam o desejo de retribuir de
alguma forma. Reconheço que essas sugestões parecem radicais hoje,
porque médicos envolvidos nos âmbitos práticos e acadêmicos estão bem
acostumados a receber grandes somas de dinheiro, jantares e presentes da
indústria. Incidentalmente, isso provém do orçamento de marketing das
companhias, pois não há verbas para “educação”.
SM – Atualmente, suas críticas em artigos e entrevistas
direcionam-se aos tratamentos alternativos e ao uso de drogas
psiquiátricas em crianças. Medicina alternativa é ruim? Há abusos na
prescrição de antipsicóticos a crianças?
Angell – Discordo
de toda a prática de medicina que não se baseie em boa pesquisa ou,
pelo menos, em forte plausibilidade biológica. Por isso, tenho postura
crítica em relação à medicina alternativa. Se tais práticas fossem
testadas cientificamente, não seriam chamadas de alternativas. Quanto à
segunda questão, drogas psiquiátricas certamente estão sendo prescritas
de forma abusiva a crianças. Digo isso baseada em pronunciamentos de
especialistas que, muitas vezes, contam com vínculos financeiros com
laboratórios farmacêuticos, em vez de comprometimento com estudos
científicos. Nos EUA, por exemplo, observa-se que problemas de
comportamento motivados por fatores sociais, econômicos e familiares
passaram a ser enquadrados na categoria “distúrbios psiquiátricos”
porque os psiquiatras que definem essas doenças têm conflitos
financeiros de interesse.
http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/marcia-angell-a-coragem-na-luta-contra-acao-de-laboratorios
Limitações da psiquiatria biomédica Controvérsias entre psiquiatras conservadores e reforma psiquiátrica Psiquiatria não comercial e íntegra Suporte para desmame de drogas psiquiátricas Concepções psicossociais Gerenciamento de benefícios/riscos dos psicoativos Acessibilidade para Deficiência psicossocial Psiquiatria com senso crítico Temas em Saúde Mental Prevenção quaternária Consumo informado Decisão compartilhada Autonomia "Movimento" de ex-usuários Alta psiquiátrica Justiça epistêmica
Pacientes produtores ativos de saúde (prosumo)
Essa avalanche de informações e conhecimento relacionada à saúde e despejada todos os dias sobre os indivíduos sem a menor cerimônia varia muito em termos de objetividade e credibilidade. Porém, é preciso admitir que ela consegue atrair cada vez mais a atenção pública para assuntos de saúde - e muda o relacionamento tradicional entre médicos e pacientes, encorajando os últimos a exercer uma atitude mais participativa na relação.
Ironicamente, enquanto os pacientes conquistam mais acesso às informações sobre saúde, os médicos têm cada vez menos tempo para estudar as últimas descobertas científicas ou para ler publicações da área - on-line ou não -, e mesmo para se comunicar adequadamente com especialistas de áreas relevantes e/ou com os próprios pacientes.
Além disso, enquanto os médicos precisam dominar conhecimentos sobre as diferentes condições de saúde de um grande número de pacientes cujos rostos eles mal conseguem lembrar, um paciente instruído, com acesso à internet, pode, na verdade, ter lido uma pesquisa mais recente do que o médico sobre sua doença específica.
Os pacientes chegam ao consultório com paginas impressas contendo o material que pesquisaram na internet, fotocópias de artigos da Physician's Desk Reference, ou recorte de outras revistas e anuários médicos. Eles fazem perguntas e não ficam mais reverenciando a figura do médico, com seu imaculado avental branco.
Aqui as mudanças no relacionamento com os fundamentos profundos do tempo e conhecimento alteraram completamente a realidade médica.
Livro: Riqueza Revolucionária - O significado da riqueza no futuro
Aviso!
Aviso!
A maioria das drogas psiquiátricas pode causar reações de abstinência, incluindo reações emocionais e físicas com risco de vida. Portanto, não é apenas perigoso iniciar drogas psiquiátricas, também pode ser perigoso pará-las.
Retirada de drogas psiquiátricas deve ser feita cuidadosamente sob supervisão clínica experiente. [Se possível] Os métodos para retirar-se com segurança das drogas psiquiátricas são discutidos no livro do Dr. Breggin: A abstinência de drogas psiquiátricas: um guia para prescritores, terapeutas, pacientes e suas famílias.
Observação: Esse site pode aumentar bastante as chances do seu psiquiatra biológico piorar o seu prognóstico, sua família recorrer a internação psiquiátrica e serem prescritas injeções de depósito (duração maior). É mais indicado descontinuar drogas psicoativas com apoio da família e psiquiatra biológico ou pelo menos consentir a ingestão de cápsulas para não aumentar o custo do tratamento desnecessariamente.
Observação 2: Esse blogue pode alimentar esperanças de que os familiares ou psiquiatras biológicos podem mudar e começar a ouvir os pacientes e se relacionarem de igual para igual e racionalmente.
A mudança de familiares e psiquiatras biológicos é uma tarefa ingrata e provavelmente impossível.
https://breggin.com/the-reform-work-of-peter-gotzsche-md/
sábado, 26 de setembro de 2015
quinta-feira, 10 de setembro de 2015
CRUELDADE SIMBÓLICA DO DIAGNÓSTICO PSIQUIÁTRICO
CRUELDADE SIMBÓLICA DO DIAGNÓSTICO PSIQUIÁTRICO (E SIMILARES).

Ramos
Natal, Rio Grande do Norte
dom, 08/06/2014 - 06:34



Tags: a tragicomédia da medicalização, diagnóstico psiquiátrico

Tentarei fazer algumas considerações a respeito das implicações da formulação de diagnósticos em psiquiatria e demais disciplinas que seguem o mesmo protocolo. Estas reflexões certamente parecerão extremamente polêmicas ou mesmo absurdas àquelas mentes formatadas por um discurso cientificista e desumanizado. Mas as ciências da saúde estão sofrendo de um déficit crônico de sutileza – e esta carência está tendo conseqüências catastróficas para a vida e o futuro das pessoas.
Antes de tudo, é preciso fazer alguns esclarecimentos. Os sintomas médicos exigem e demandam um diagnóstico. Quanto antes ocorrer a prescrição do correto diagnóstico, tanto melhor para a eficácia do tratamento. Já os transtornos mentais, não. E aqui é preciso fazer uma diferenciação entre as doenças do cérebro – as quais podem ser tratadas com medicamentos ou cirurgia – e as “doenças” ou transtornos mentais, que demandam um protocolo diferenciado e um tratamento específico. Todo o esforço da psiquiatria e de boa parte dos neurocientistas é tentar demonstrar que os transtornos mentais são doenças ou desequilíbrios do cérebro. Conversa pra boi dormir.
Por que afirmo que o diagnóstico, no caso dos transtornos mentais, exigem um tratamento diferenciado?
É que, em psiquiatria, o diagnostico vem sempre acompanhado de uma trilogia maligna: (a) descontextualização, (b) naturalização e (c) perenização do sofrimento psíquico.
A fim de ilustrar e embasar a argumentação, vou citar dois casos clínicos – o de Roberta (fictício) e o de Márcia (real).
ROBERTA: Trata-se de uma adolescente que apresenta acessos freqüentes de fúria incontrolável. Seu comportamento tanto na escola quando em casa é caracterizado por atitudes ríspidas quando não extremamente agressivas. Além de não respeitar os pais e questionar-lhes a autoridade, por vezes quebra objetos e agride fisicamente a mãe. Ameaça fugir de casa ou se matar. Preocupada, a família a leva ao psiquiatra. Na consulta, após analisar os seus sintomas, ela é diagnosticada como portadora do Transtorno Explosivo Intermitente (TEI). São-lhe prescritos ansiolíticos e calmantes.
MÁRCIA: Sempre fora muito apegada à família. Com a morte do pai, fica profundamente triste e desconsolada. Levam-na a um psiquiatra. Ela é diagnosticada como sofrendo de Depressão, e prescrevem-lhe três medicamentos. Ela começa a tomá-lo e sua vida piora a cada dia. Sua relação como marido, que não ia bem, se deteriora. Eles se separam. Surgem os sintomas de pânico. Não consegue mais trabalhar. Vive durante dez anos afastada de suas atividades profissionais em função do pânico e da depressão. Freqüentemente padece de fome em casa por não conseguir atravessar a rua para comprar alimentos na venda da esquina. Chega ao consultório andando com dificuldade, amparada e auxiliada por dois familiares. Seus movimentos são lentos, sua voz carregada.
A) Descontextualização.
Ocorre quando se supõe que os transtornos mentais são decorrentes de alterações químicas no cérebro. Não há dúvida de que todo pensamento e todo sentimento vem acompanhado de uma alteração química no cérebro. Mas a alteração química explica o surgimento do pensamento, do sentimento e do transtorno? Não. E por que não? A razão é que o surgimento de um hormônio ou substância no cérebro se dá por alguma razão. E a razão é de ordem psíquica.
Voltemos aos nossos exemplos. Roberta vivia com o padrasto e a mãe. O padrasto estava abusando sexualmente de sua enteada há meses. A mãe parecia não se dar conta do que se passava dentro de casa. Não havia intimidade entre a mãe e o padrasto. A mãe sofrera no passado de violência sexual, o que a fazia ter pavor de sexo. Desta forma, consciente ou inconscientemente, deixar de ser solicitada pelo padrasto foi para ela um alívio. A filha ensaiou denunciar os abusos que sofria à mãe, mas esta os desconsiderou. Foi aí que os acessos de raiva começaram.
Já o calvário de Márcia teve início quando ela foi diagnosticada como deprimida, após a morte do pai. Sempre fora uma jovem dinâmica, independente e trabalhadora. Era para ela se sentir feliz com a morte da pessoa que mais amava? A sua tristeza foi patologizada.
Tanto num caso como no outro, o diagnóstico psiquiátrico operou um psicocídio: ao ser formulado, colocou “entre parênteses” todo o contexto que levou ao surgimento dos sintomas e transformou os seus portadores em coisas, em animais sem vida própria, sem história, sem fala e dignidade. O diagnóstico matou a subjetividade, restando apenas um corpo com uma patologia.
B) Naturalização.
O ser humano é um animal cultural. Quando se supõe que um transtorno psíquico decorre de um desequilíbrio químico no cérebro, reduz-se o homem a um código de barras, a uma simples mercadoria, a uma coisa. Toda doença e principalmente todo transtorno decorre da confluência de múltiplos fatores. Quando a psiquiatria envereda por esse caminho reducionista sem escutar o sujeito e sem levar em conta o histórico de sofrimentos que se ocultam por trás do sintoma, morre enquanto tal. Converte-se em encefalatria.
C) Perenização.
“Quando o psiquiatra enquadra, classifica e diagnostica, distancia-se inevitavelmente de uma postura terapêutica aberta, prospectiva e amorosa. Seu olhar é retrógrado e petrificador - petrifica o paciente num estigma, e congela o próprio olhar do psiquiatra no diagnóstico realizado num determinado momento, dificultando-lhe a percepção da evolução ou variação da sintomatologia do mesmo paciente ao longo do tempo, centrando-se no que já está posto, ou seja, atua no sentido de capturar o paciente numa classificação nosológica”. (A Tragicomédia da Medicalização: a Psiquiatria e a Morte do Sujeito, Natal (RN), Sapiens: 2012. Segundo Ato, Das Classificações).
Voltemos ao caso de Márcia, afastada do trabalho por uma Junta Médica há uma década. Quando, na segunda sessão, o terapeuta, através de um trabalho vivencial e reflexivo acerca do papel que ela estava representando na sua própria vida, a faz ver que ela estava assumindo um papel de vítima, de doente, acobertado e justificado pela psiquiatria, ela se DESCOLA do rótulo. Toma consciência que o rótulo a escava colocando numa jaula simbólica ad infinitum. Na terceira sessão, ela afirma: “Vou voltar a estudar! Vou pegar carona com a minha sobrinha, que passou no vestibular. Não vou perder essa oportunidade!”
Nesta conformidade, ela se sentia “doente” simplesmente porque se colocava e aceitava o papel de doente. No momento que percebe que ela mesma alimentava aquele papel que a fazia vegetar, decide mudar. E volta a viver.
Se o transtorno psíquico é causado por um desequilíbrio químico do cérebro, quando o tratamento vai acabar? Nunca se sabe. Supondo-se que a atividade cerebral seja regulada pela genética, a resposta é: nunca. O paciente precisa ser medicado para todo o sempre. E, mesmo que os sintomas estejam ausentes, pode ser prudente medicar-se “de forma preventiva” para evitar uma recidiva.
Essa trilogia maligna é uma expressão inequívoca do processo de medicalização da vida. O Transtorno de Explosividade Intermitente poderia ser considerado uma piada, se não fosse uma tragédia.
E aí, para finalizar, temos algumas possibilidades.
Primeira: Diagnóstico + medicação (sem tratamento).
Esse procedimento é o mais usual, especialmente na rede pública. O sujeito vai ao psiquiatra e sai com um remédio na mão. Esse holocausto da subjetividade é perpetrado diariamente nos postos de saúde e rede pública.
Segunda: Diagnóstico + medicação + tratamento.
Pode-se fazer uso do diagnóstico, ou seja, de um procedimento simbolicamente cruel, para a obtenção de dois direitos – o remédio e o tratamento psicológico. Isso funciona?
Cito outro trecho (é longo, mas é importante):
"(...) Ao medicar um paciente sob a alegação de ajudá-lo em seu tratamento, os psiquiatras não estão se colocando do lado daquele que sofre, mas sim a favor do pharmacolonialismo, que se move predominantemente na lógica do capital. Isto porque a medicalização suprime a ética do cuidado de si, a estética e a motivação que poderia levar à cura, sendo, portanto, inimiga da subjetivação.
Com efeito, os medicamentos não funcionam da mesma maneira para todos. Os indivíduos são diferentes e reagem de forma desigual aos estímulos. Da mesma forma do que ocorre em relação à nutrição, onde um alimento saudável pode ser danoso para alguém que possua alguma rejeição aos ingredientes dele, os indivíduos apresentam reações diversas em relação a uma mesma droga. Uma substância administrada para amenizar a depressão pode, por exemplo, induzir ao suicídio a determinadas pessoas. Assim, o princípio ativo pode provocar reações inversas às pretendidas. Confiar num medicamento é sempre uma aposta perigosa e imprevisível.
O CORO: “O que é válido para alguns, pode não ser válido para todos.”
Contudo, o discurso biomédico sustenta, e com razão, que o uso dos medicamentos, apesar dessas “anomalias”, dessas variações individuais indesejáveis, efetivamente funciona para um bom número de pessoas. Entretanto, como a medicação está dissociada de uma dietética existencial, ou seja, de um estilo de vida, quando o indivíduo é medicado (ou se automedica) e constata um efeito positivo no melhoramento dos seus sintomas, sente-se imediatamente autorizado a desequilibrar-se ainda mais, já que tem à mão um recurso que pode contornar e aliviar os excessos cometidos.O remédio converte-se na senha para empreender toda a sorte de desatinos(1).
Assim, por exemplo, um portador de diabetes, ao tomar um remédio que diminui as taxas de glicose no sangue, sente-se livre para abusar dos docinhos. Um viciado em bebidas alcoólicas, ao perceber que suas dores abdominais diminuem com um remédio para o fígado, permite-se abusar mais ainda do álcool. Ao receber um transplante de coração, um pedreiro, ao sair da sala de cirurgia, falou para um repórter: “Estou me sentindo tão bem que vou comemorar comendo um churrasco!”
O mesmo vale para os psicofármacos: aquele que se sente ansioso, ao ver a sua ansiedade ser suavizada por um ansiolítico, permite-se adotar um estilo de vida mais agitado e frenético do que antes, graças às conquistas da farmacologia. Alguém que esteja triste pela perda de um ente querido, ao tomar um antidepressivo pode indefinidamente sentir-se propenso a apegar-se à lembrança do morto, cuja perda acha inaceitável e intolerável, impedindo-lhe a elaboração do luto. Ou seja, mesmo que funcione, o remédio ainda assim é danoso para um grande número de pessoas, já que o tratamento é focado nos sintomas e não em cima de suas causas que continuam ativas e atuantes, embora ocultas.
O CORO: “Quanto melhor o remédio, tanto pior será!”
Porém, há ainda, por último, o restrito grupo daqueles que tomam um psicoativo e ele efetivamente funciona, os quais não se autorizam a praticar nenhum tipo de excessos, seguindo fielmente o protocolo médico prescrito. Benditos, esses bons pacientes! O sonho de todos os psiquiatras! Para esses, o medicamento, quando ingerido, age como uma máscara trágica a se interpor entre o sujeito e os seus sentimentos e emoções. A máscara dá a ele uma aparência de universal normalidade, e a sua individualidade é eclipsada por trás dela. E mais: ele não mais consegue sentir-se e perceber-se como outrora: o medicamento altera o seu humor, tornando-o “adequado” ou “saudável” dentro de normalizações socialmente determinadas.
A consequência desta acomodação clínica do sintoma é evitar que o indivíduo entre em contato com as verdadeiras causas de seu malestar. Ora, ora! Nenhum psiquiatra bem intencionado e esclarecido sustentaria que o remédio por si só possa resolver todos os males! O ideal é que ele venha acompanhado de uma psicoterapia a fim de reforçar e retroalimentar os efeitos positivos da medicação. Terapia e remédio, remédio e terapia: remédio para o corpo, terapia para a alma! No entanto, ao contrário de todos aqueles que pregam que a medicação e a terapia caminham muito bem juntas, na verdade a medicação é o maior empecilho para um efetivo avanço terapêutico. E o motivo é óbvio e irrefutável: nós nunca desejamos tanto estar saudáveis como ao nos sentirmos doentes; nós nunca desejamos tanto comer um alimento como quando sentimos nas vísceras a fome nos corroer por dentro; nós nunca ansiamos tanto por carinho como nos momentos em que nos sentimos sós e desamparados. Ora, se o medicamento diminui ou cessa o mal-estar, elimina também aquilo que poderia ser a motivação para a busca do bem-estar(2). Se o medicamento minimiza o sofrimento, diminui também a capacidade de sentir prazer. Isto porque há uma harmonia entre os opostos em todas as coisas, e um oposto remete para o seu pólo oposto e complementar."
Terceira possibilidade: Diagnóstico + tratamento (sem medicação)
É, na maioria dos casos, preferível a todas as outras. Evita os efeitos colaterais da medicação e não atrapalha no tratamento. Só em casos especiais não seria recomendável.
Por fim, a guisa de conclusão, cito um trecho do livro “A Tragicomédia da Medicalização”, onde a violência simbólica do diagnóstico é resumida:
“Eis – antecipando o que diremos ao longo deste opúsculo - as etapas da violência simbólica à qual o paciente é submetido: primeiro, ele é nomeado pelo diagnóstico como portador de algum distúrbio ou perturbação; segundo, pelo diagnóstico o rótulo adere ao paciente como um estigma, tal como as marcas de identificação apostas aos animais quando são ferrados; terceiro, ele é rebanhizado, ou seja, as referências se deslocam de sua personalidade individual e única para o rebanho anônimo e indistinto da categoria nosológica em que é agrupado. As consequências desta rebanhização são, de um lado, a despersonalização e perda de referenciais internos; e, de outro, a terapêutica medicamentosa indicada será aquela aplicável não ao indivíduo na sua singularidade, mas sim ao rebanho no qual ele foi inserido, ou seja, aplicar-se-á um remédio inespecífico para um indivíduo genérico que não existe enquanto tal”.
Em suma, para não cansar demais os leitores: a formulação precipitada de um diagnóstico para um transtorno psíquico é um desserviço àqueles que buscam o autoconhecimento e a autotransformação, tendo apenas uma função de viabilizar um controle biopolítico sobre os corpos e as mentes dos pacientes.
Saudações,
José Ramos Coelho
(1)“(...) a educação age sobre o nível de vida em uma proporção duas vezes e meia mais importante do que o consumo médico” – afirma Michel FOUCAULT, retomando a tese de Ivan Illich. – “Conclui-se que, para viver mais tempo, um bom nível de educação é preferível ao consumo médico” (2011, p.390)
(2) Com profunda sabedoria, pontifica o Dr. Edward BACH: “... a doença, posto que pareça tão cruel, é benéfica e existe para nosso próprio bem; se interpretada de maneira correta, guiar-nos-á em direção aos nossos defeitos principais. Se tratada com propriedade, será a causa da supressão desses defeitos e fará de nós pessoas melhores e mais evoluídas do que éramos antes. O sofrimento é um corretivo para se salientar uma lição que de outro modo não haveríamos de aprender, e ele jamais poderá ser dispensado até que a lição seja totalmente assimilada”. (2010, p.18). O combate precipitado aos sintomas está a serviço da manutenção da ignorância e da cegueira. - See more at: http://www.redehumanizasus.net/84706-a-crueldade-simbolica-do-diagnostico-psiquiatrico-e-similares#sthash.PXGMTufA.dpuf
CRUELDADE SIMBÓLICA DO DIAGNÓSTICO PSIQUIÁTRICO (E SIMILARES).

Ramos
Natal, Rio Grande do Norte
dom, 08/06/2014 - 06:34



Tags: a tragicomédia da medicalização, diagnóstico psiquiátrico

Tentarei fazer algumas considerações a respeito das implicações da formulação de diagnósticos em psiquiatria e demais disciplinas que seguem o mesmo protocolo. Estas reflexões certamente parecerão extremamente polêmicas ou mesmo absurdas àquelas mentes formatadas por um discurso cientificista e desumanizado. Mas as ciências da saúde estão sofrendo de um déficit crônico de sutileza – e esta carência está tendo conseqüências catastróficas para a vida e o futuro das pessoas.
Antes de tudo, é preciso fazer alguns esclarecimentos. Os sintomas médicos exigem e demandam um diagnóstico. Quanto antes ocorrer a prescrição do correto diagnóstico, tanto melhor para a eficácia do tratamento. Já os transtornos mentais, não. E aqui é preciso fazer uma diferenciação entre as doenças do cérebro – as quais podem ser tratadas com medicamentos ou cirurgia – e as “doenças” ou transtornos mentais, que demandam um protocolo diferenciado e um tratamento específico. Todo o esforço da psiquiatria e de boa parte dos neurocientistas é tentar demonstrar que os transtornos mentais são doenças ou desequilíbrios do cérebro. Conversa pra boi dormir.
Por que afirmo que o diagnóstico, no caso dos transtornos mentais, exigem um tratamento diferenciado?
É que, em psiquiatria, o diagnostico vem sempre acompanhado de uma trilogia maligna: (a) descontextualização, (b) naturalização e (c) perenização do sofrimento psíquico.
A fim de ilustrar e embasar a argumentação, vou citar dois casos clínicos – o de Roberta (fictício) e o de Márcia (real).
ROBERTA: Trata-se de uma adolescente que apresenta acessos freqüentes de fúria incontrolável. Seu comportamento tanto na escola quando em casa é caracterizado por atitudes ríspidas quando não extremamente agressivas. Além de não respeitar os pais e questionar-lhes a autoridade, por vezes quebra objetos e agride fisicamente a mãe. Ameaça fugir de casa ou se matar. Preocupada, a família a leva ao psiquiatra. Na consulta, após analisar os seus sintomas, ela é diagnosticada como portadora do Transtorno Explosivo Intermitente (TEI). São-lhe prescritos ansiolíticos e calmantes.
MÁRCIA: Sempre fora muito apegada à família. Com a morte do pai, fica profundamente triste e desconsolada. Levam-na a um psiquiatra. Ela é diagnosticada como sofrendo de Depressão, e prescrevem-lhe três medicamentos. Ela começa a tomá-lo e sua vida piora a cada dia. Sua relação como marido, que não ia bem, se deteriora. Eles se separam. Surgem os sintomas de pânico. Não consegue mais trabalhar. Vive durante dez anos afastada de suas atividades profissionais em função do pânico e da depressão. Freqüentemente padece de fome em casa por não conseguir atravessar a rua para comprar alimentos na venda da esquina. Chega ao consultório andando com dificuldade, amparada e auxiliada por dois familiares. Seus movimentos são lentos, sua voz carregada.
A) Descontextualização.
Ocorre quando se supõe que os transtornos mentais são decorrentes de alterações químicas no cérebro. Não há dúvida de que todo pensamento e todo sentimento vem acompanhado de uma alteração química no cérebro. Mas a alteração química explica o surgimento do pensamento, do sentimento e do transtorno? Não. E por que não? A razão é que o surgimento de um hormônio ou substância no cérebro se dá por alguma razão. E a razão é de ordem psíquica.
Voltemos aos nossos exemplos. Roberta vivia com o padrasto e a mãe. O padrasto estava abusando sexualmente de sua enteada há meses. A mãe parecia não se dar conta do que se passava dentro de casa. Não havia intimidade entre a mãe e o padrasto. A mãe sofrera no passado de violência sexual, o que a fazia ter pavor de sexo. Desta forma, consciente ou inconscientemente, deixar de ser solicitada pelo padrasto foi para ela um alívio. A filha ensaiou denunciar os abusos que sofria à mãe, mas esta os desconsiderou. Foi aí que os acessos de raiva começaram.
Já o calvário de Márcia teve início quando ela foi diagnosticada como deprimida, após a morte do pai. Sempre fora uma jovem dinâmica, independente e trabalhadora. Era para ela se sentir feliz com a morte da pessoa que mais amava? A sua tristeza foi patologizada.
Tanto num caso como no outro, o diagnóstico psiquiátrico operou um psicocídio: ao ser formulado, colocou “entre parênteses” todo o contexto que levou ao surgimento dos sintomas e transformou os seus portadores em coisas, em animais sem vida própria, sem história, sem fala e dignidade. O diagnóstico matou a subjetividade, restando apenas um corpo com uma patologia.
B) Naturalização.
O ser humano é um animal cultural. Quando se supõe que um transtorno psíquico decorre de um desequilíbrio químico no cérebro, reduz-se o homem a um código de barras, a uma simples mercadoria, a uma coisa. Toda doença e principalmente todo transtorno decorre da confluência de múltiplos fatores. Quando a psiquiatria envereda por esse caminho reducionista sem escutar o sujeito e sem levar em conta o histórico de sofrimentos que se ocultam por trás do sintoma, morre enquanto tal. Converte-se em encefalatria.
C) Perenização.
“Quando o psiquiatra enquadra, classifica e diagnostica, distancia-se inevitavelmente de uma postura terapêutica aberta, prospectiva e amorosa. Seu olhar é retrógrado e petrificador - petrifica o paciente num estigma, e congela o próprio olhar do psiquiatra no diagnóstico realizado num determinado momento, dificultando-lhe a percepção da evolução ou variação da sintomatologia do mesmo paciente ao longo do tempo, centrando-se no que já está posto, ou seja, atua no sentido de capturar o paciente numa classificação nosológica”. (A Tragicomédia da Medicalização: a Psiquiatria e a Morte do Sujeito, Natal (RN), Sapiens: 2012. Segundo Ato, Das Classificações).
Voltemos ao caso de Márcia, afastada do trabalho por uma Junta Médica há uma década. Quando, na segunda sessão, o terapeuta, através de um trabalho vivencial e reflexivo acerca do papel que ela estava representando na sua própria vida, a faz ver que ela estava assumindo um papel de vítima, de doente, acobertado e justificado pela psiquiatria, ela se DESCOLA do rótulo. Toma consciência que o rótulo a escava colocando numa jaula simbólica ad infinitum. Na terceira sessão, ela afirma: “Vou voltar a estudar! Vou pegar carona com a minha sobrinha, que passou no vestibular. Não vou perder essa oportunidade!”
Nesta conformidade, ela se sentia “doente” simplesmente porque se colocava e aceitava o papel de doente. No momento que percebe que ela mesma alimentava aquele papel que a fazia vegetar, decide mudar. E volta a viver.
Se o transtorno psíquico é causado por um desequilíbrio químico do cérebro, quando o tratamento vai acabar? Nunca se sabe. Supondo-se que a atividade cerebral seja regulada pela genética, a resposta é: nunca. O paciente precisa ser medicado para todo o sempre. E, mesmo que os sintomas estejam ausentes, pode ser prudente medicar-se “de forma preventiva” para evitar uma recidiva.
Essa trilogia maligna é uma expressão inequívoca do processo de medicalização da vida. O Transtorno de Explosividade Intermitente poderia ser considerado uma piada, se não fosse uma tragédia.
E aí, para finalizar, temos algumas possibilidades.
Primeira: Diagnóstico + medicação (sem tratamento).
Esse procedimento é o mais usual, especialmente na rede pública. O sujeito vai ao psiquiatra e sai com um remédio na mão. Esse holocausto da subjetividade é perpetrado diariamente nos postos de saúde e rede pública.
Segunda: Diagnóstico + medicação + tratamento.
Pode-se fazer uso do diagnóstico, ou seja, de um procedimento simbolicamente cruel, para a obtenção de dois direitos – o remédio e o tratamento psicológico. Isso funciona?
Cito outro trecho (é longo, mas é importante):
"(...) Ao medicar um paciente sob a alegação de ajudá-lo em seu tratamento, os psiquiatras não estão se colocando do lado daquele que sofre, mas sim a favor do pharmacolonialismo, que se move predominantemente na lógica do capital. Isto porque a medicalização suprime a ética do cuidado de si, a estética e a motivação que poderia levar à cura, sendo, portanto, inimiga da subjetivação.
Com efeito, os medicamentos não funcionam da mesma maneira para todos. Os indivíduos são diferentes e reagem de forma desigual aos estímulos. Da mesma forma do que ocorre em relação à nutrição, onde um alimento saudável pode ser danoso para alguém que possua alguma rejeição aos ingredientes dele, os indivíduos apresentam reações diversas em relação a uma mesma droga. Uma substância administrada para amenizar a depressão pode, por exemplo, induzir ao suicídio a determinadas pessoas. Assim, o princípio ativo pode provocar reações inversas às pretendidas. Confiar num medicamento é sempre uma aposta perigosa e imprevisível.
O CORO: “O que é válido para alguns, pode não ser válido para todos.”
Contudo, o discurso biomédico sustenta, e com razão, que o uso dos medicamentos, apesar dessas “anomalias”, dessas variações individuais indesejáveis, efetivamente funciona para um bom número de pessoas. Entretanto, como a medicação está dissociada de uma dietética existencial, ou seja, de um estilo de vida, quando o indivíduo é medicado (ou se automedica) e constata um efeito positivo no melhoramento dos seus sintomas, sente-se imediatamente autorizado a desequilibrar-se ainda mais, já que tem à mão um recurso que pode contornar e aliviar os excessos cometidos.O remédio converte-se na senha para empreender toda a sorte de desatinos(1).
Assim, por exemplo, um portador de diabetes, ao tomar um remédio que diminui as taxas de glicose no sangue, sente-se livre para abusar dos docinhos. Um viciado em bebidas alcoólicas, ao perceber que suas dores abdominais diminuem com um remédio para o fígado, permite-se abusar mais ainda do álcool. Ao receber um transplante de coração, um pedreiro, ao sair da sala de cirurgia, falou para um repórter: “Estou me sentindo tão bem que vou comemorar comendo um churrasco!”
O mesmo vale para os psicofármacos: aquele que se sente ansioso, ao ver a sua ansiedade ser suavizada por um ansiolítico, permite-se adotar um estilo de vida mais agitado e frenético do que antes, graças às conquistas da farmacologia. Alguém que esteja triste pela perda de um ente querido, ao tomar um antidepressivo pode indefinidamente sentir-se propenso a apegar-se à lembrança do morto, cuja perda acha inaceitável e intolerável, impedindo-lhe a elaboração do luto. Ou seja, mesmo que funcione, o remédio ainda assim é danoso para um grande número de pessoas, já que o tratamento é focado nos sintomas e não em cima de suas causas que continuam ativas e atuantes, embora ocultas.
O CORO: “Quanto melhor o remédio, tanto pior será!”
Porém, há ainda, por último, o restrito grupo daqueles que tomam um psicoativo e ele efetivamente funciona, os quais não se autorizam a praticar nenhum tipo de excessos, seguindo fielmente o protocolo médico prescrito. Benditos, esses bons pacientes! O sonho de todos os psiquiatras! Para esses, o medicamento, quando ingerido, age como uma máscara trágica a se interpor entre o sujeito e os seus sentimentos e emoções. A máscara dá a ele uma aparência de universal normalidade, e a sua individualidade é eclipsada por trás dela. E mais: ele não mais consegue sentir-se e perceber-se como outrora: o medicamento altera o seu humor, tornando-o “adequado” ou “saudável” dentro de normalizações socialmente determinadas.
A consequência desta acomodação clínica do sintoma é evitar que o indivíduo entre em contato com as verdadeiras causas de seu malestar. Ora, ora! Nenhum psiquiatra bem intencionado e esclarecido sustentaria que o remédio por si só possa resolver todos os males! O ideal é que ele venha acompanhado de uma psicoterapia a fim de reforçar e retroalimentar os efeitos positivos da medicação. Terapia e remédio, remédio e terapia: remédio para o corpo, terapia para a alma! No entanto, ao contrário de todos aqueles que pregam que a medicação e a terapia caminham muito bem juntas, na verdade a medicação é o maior empecilho para um efetivo avanço terapêutico. E o motivo é óbvio e irrefutável: nós nunca desejamos tanto estar saudáveis como ao nos sentirmos doentes; nós nunca desejamos tanto comer um alimento como quando sentimos nas vísceras a fome nos corroer por dentro; nós nunca ansiamos tanto por carinho como nos momentos em que nos sentimos sós e desamparados. Ora, se o medicamento diminui ou cessa o mal-estar, elimina também aquilo que poderia ser a motivação para a busca do bem-estar(2). Se o medicamento minimiza o sofrimento, diminui também a capacidade de sentir prazer. Isto porque há uma harmonia entre os opostos em todas as coisas, e um oposto remete para o seu pólo oposto e complementar."
Terceira possibilidade: Diagnóstico + tratamento (sem medicação)
É, na maioria dos casos, preferível a todas as outras. Evita os efeitos colaterais da medicação e não atrapalha no tratamento. Só em casos especiais não seria recomendável.
Por fim, a guisa de conclusão, cito um trecho do livro “A Tragicomédia da Medicalização”, onde a violência simbólica do diagnóstico é resumida:
“Eis – antecipando o que diremos ao longo deste opúsculo - as etapas da violência simbólica à qual o paciente é submetido: primeiro, ele é nomeado pelo diagnóstico como portador de algum distúrbio ou perturbação; segundo, pelo diagnóstico o rótulo adere ao paciente como um estigma, tal como as marcas de identificação apostas aos animais quando são ferrados; terceiro, ele é rebanhizado, ou seja, as referências se deslocam de sua personalidade individual e única para o rebanho anônimo e indistinto da categoria nosológica em que é agrupado. As consequências desta rebanhização são, de um lado, a despersonalização e perda de referenciais internos; e, de outro, a terapêutica medicamentosa indicada será aquela aplicável não ao indivíduo na sua singularidade, mas sim ao rebanho no qual ele foi inserido, ou seja, aplicar-se-á um remédio inespecífico para um indivíduo genérico que não existe enquanto tal”.
Em suma, para não cansar demais os leitores: a formulação precipitada de um diagnóstico para um transtorno psíquico é um desserviço àqueles que buscam o autoconhecimento e a autotransformação, tendo apenas uma função de viabilizar um controle biopolítico sobre os corpos e as mentes dos pacientes.
Saudações,
José Ramos Coelho
(1)“(...) a educação age sobre o nível de vida em uma proporção duas vezes e meia mais importante do que o consumo médico” – afirma Michel FOUCAULT, retomando a tese de Ivan Illich. – “Conclui-se que, para viver mais tempo, um bom nível de educação é preferível ao consumo médico” (2011, p.390)
(2) Com profunda sabedoria, pontifica o Dr. Edward BACH: “... a doença, posto que pareça tão cruel, é benéfica e existe para nosso próprio bem; se interpretada de maneira correta, guiar-nos-á em direção aos nossos defeitos principais. Se tratada com propriedade, será a causa da supressão desses defeitos e fará de nós pessoas melhores e mais evoluídas do que éramos antes. O sofrimento é um corretivo para se salientar uma lição que de outro modo não haveríamos de aprender, e ele jamais poderá ser dispensado até que a lição seja totalmente assimilada”. (2010, p.18). O combate precipitado aos sintomas está a serviço da manutenção da ignorância e da cegueira. - See more at: http://www.redehumanizasus.net/84706-a-crueldade-simbolica-do-diagnostico-psiquiatrico-e-similares#sthash.PXGMTufA.dpuf
quinta-feira, 20 de agosto de 2015
ciencia e filosofia
"A ciência é o que você sabe, a filosofia é o que você não sabe" - Bertrand Russell.
terça-feira, 18 de agosto de 2015
Jogos familiares - Nós (Laing)
Os outros disseram que ela era estúpida. então ela
se fez a si própria estúpido para não ver como
estúpido
eles estavam a pensar que ela era estúpida,
porque era ruim pensar que eles eram
estúpido.
Ela preferiu ser estúpido e bom,
em vez de ruim e inteligente.
É ruim ser estúpido: ela precisa ser
inteligente
para ser tão bom e estúpido.
É ruim ser inteligente, porque isso mostra
como eles eram estúpidos
para lhe dizer como ela era estúpida.
se fez a si própria estúpido para não ver como
estúpido
eles estavam a pensar que ela era estúpida,
porque era ruim pensar que eles eram
estúpido.
Ela preferiu ser estúpido e bom,
em vez de ruim e inteligente.
É ruim ser estúpido: ela precisa ser
inteligente
para ser tão bom e estúpido.
É ruim ser inteligente, porque isso mostra
como eles eram estúpidos
para lhe dizer como ela era estúpida.
Ronald Laing. Knots.
segunda-feira, 17 de agosto de 2015
rd laing
Ele também assumiu o desafio diagnóstico psiquiátrico, argumentando que o diagnóstico de um transtorno mental contradisse aceito procedimento médico: diagnóstico foi feito com base no comportamento ou conduta, e análise e exames complementares que tradicionalmente preceder o diagnóstico de patologias viáveis (como ossos quebrados ou pneumonia) ocorreu após o diagnóstico de transtorno mental (se em tudo). Assim, de acordo com Laing, psiquiatria foi fundada em uma epistemologia falsa: doença diagnosticada pela conduta, mas tratados biologicamente.
Laing sustentou que a esquizofrenia era "uma teoria não um fato"; ele acreditava que os modelos de esquizofrenia herdada geneticamente que está sendo promovido pela psiquiatria base biológica não foram aceites pelos principais médicos geneticistas [15] Ele rejeitou o "modelo médico de doença mental."; de acordo com o diagnóstico de doença mental Laing não seguiu um modelo médico tradicional; e isso o levou a questionar o uso de medicação, como os antipsicóticos de psiquiatria. Sua atitude para com drogas era muito diferente; em particular, ele defendia uma anarquia de experiência. [16]
quarta-feira, 5 de agosto de 2015
sábado, 1 de agosto de 2015
DSM ateorético?
Far from genuinely atheoretical, the Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders sys-
tem (DSM; American Psychiatric Association, 1994) fosters a crude biological view (Horwitz, 2002).
longe de genuinamente ateorético, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais sis-
TEM (DSM; American Psychiatric Association, 1994) promove um concepção cruamente biológica
(Horwitz, 2002).
tem (DSM; American Psychiatric Association, 1994) fosters a crude biological view (Horwitz, 2002).
longe de genuinamente ateorético, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais sis-
TEM (DSM; American Psychiatric Association, 1994) promove um concepção cruamente biológica
(Horwitz, 2002).
terça-feira, 30 de junho de 2015
Podemos falar em uma 'química da qualidade de vida'?
Coluna (Edição nº 24)
"Podemos falar em uma 'química da qualidade de vida'?", por Rogério Lopes Azize (*)
"Podemos falar em uma 'química da qualidade de vida'?", por Rogério Lopes Azize (*)
Os corpos contemporâneos carregam o peso de grandes expectativas e muitas ansiedades. Especialmente em uma cultura que pode ser chamada “de classe média urbana”, o corpo está cercado de regras e constrangimentos no que se refere à sua estética, formato, virilidade, desempenho físico, saúde adequada e performance social. As possibilidades técnicas de intervenção do indivíduo sobre o seu próprio corpo multiplicam-se em diversas frentes. Das salas de cirurgia às salas de musculação, passando pelas farmácias, busca-se aprimorar a performance do corpo em campos tão diferentes quanto a estética corporal, a sexualidade e a saúde psíquica.
Essa coluna propõe uma breve reflexão a respeito de um aspecto específico dessa cultura que reserva grande atenção ao corpo e à saúde: o consumo de medicamentos. Parto da percepção de que vivemos hoje uma “cultura medicamentosa” entre as classes médias urbanas, que justifica e incentiva o consumo de medicamentos. Vou me concentrar no discurso dos laboratórios farmacêuticos a respeito de certos medicamentos que foram reunidos sob um mesmo rótulo pelos meios de comunicação de massa: os “medicamentos do estilo de vida” ou “life-style drugs”. Apesar de terem funções muito diferentes, o discurso dos laboratórios farmacêuticos a respeito de medicamentos de grande sucesso comercial – destaco aqui pílulas como Viagra, Xenical e Prozac, que tratam, nessa ordem, da disfunção erétil, da obesidade e da depressão – possui pontos em comum que me chamaram atenção.
Essa coluna propõe uma breve reflexão a respeito de um aspecto específico dessa cultura que reserva grande atenção ao corpo e à saúde: o consumo de medicamentos. Parto da percepção de que vivemos hoje uma “cultura medicamentosa” entre as classes médias urbanas, que justifica e incentiva o consumo de medicamentos. Vou me concentrar no discurso dos laboratórios farmacêuticos a respeito de certos medicamentos que foram reunidos sob um mesmo rótulo pelos meios de comunicação de massa: os “medicamentos do estilo de vida” ou “life-style drugs”. Apesar de terem funções muito diferentes, o discurso dos laboratórios farmacêuticos a respeito de medicamentos de grande sucesso comercial – destaco aqui pílulas como Viagra, Xenical e Prozac, que tratam, nessa ordem, da disfunção erétil, da obesidade e da depressão – possui pontos em comum que me chamaram atenção.
Mais do que as marcas específicas, interessa-me a cultura que cerca o consumo destes medicamentos, o sentido atribuído ao seu consumo e o cruzamento desta prática terapêutica com outros hábitos que circulam no espaço urbano ocidental contemporâneo. Trabalho com a hipótese de que os usuários das pílulas Viagra, Xenical e Prozac dividem um campo semântico comum, um idioma que faz uso freqüente e peculiar das idéias de saúde e qualidade de vida. Nas fronteiras de uma cultura de classe média, percebe-se uma noção de saúde que já não mais ocupa o posto de contrário à idéia de doença; e uma noção de qualidade de vida que se tornou uma espécie de chave-mágica da sociedade contemporânea, uma palavra-chave que pode justificar mudanças no cotidiano, consumo, novos hábitos e mudanças marcantes no estilo de vida. Se uma ação qualquer vai trazer ao seu agente mais qualidade de vida, então esta ação é socialmente justificável; apesar da categoria apresentar um significado nebuloso, seu reconhecimento é imediato na cultura de classe média urbana e o seu uso é bastante freqüente.
Trago abaixo trechos de peças de marketing (anúncios, sites) dos laboratórios farmacêuticos a respeito das doenças citadas que ilustram essa percepção:
Conversar com um médico sobre desempenho sexual é mais fácil do que conviver com o problema. Quem já teve dificuldades de ereção sabe como isso pode prejudicar a qualidade de vida. (Trecho do texto de um anúncio da Pfizer, laboratório fabricante da pílula Viagra, veiculado na revista Veja)
Doença dispendiosa, de alto risco, crônica e reincidente, a obesidade afeta milhões de pessoas em todo o mundo, inclusive crianças. Embora não seja nova, ela assume agora proporções epidêmicas e está aumentando. Esta tendência é, sem dúvida, alarmante em virtude das doenças associadas à obesidade. (...) A obesidade é sinônimo de perda da qualidade de vida. (Trecho retirado do site www.obesidade.com.br, mantido pelo laboratório Roche, fabricante da pílula Xenical)
Diagnosticar com precisão e tratar adequadamente um estado depressivo são procedimentos fundamentais para evitar riscos decorrentes da doença, e devolver ao paciente uma boa qualidade de vida (...) À volta de um paciente deve haver a compreensão de que a depressão não é preguiça, nem falta de caráter ou de vontade. Não adianta pedir ao paciente que reaja, pois ele precisa de medicamentos. (Trechos retirados de informes publicitários que se propunham a prestar esclarecimentos sobre a depressão, parte de uma campanha do laboratório Wyeth, veiculados no Caderno Folha Equilíbrio da Folha de São Paulo)
O campo biomédico nos oferece, através de uma racionalidade própria, uma forma de encarar os sintomas considerados patológicos e o tratamento adequado para tais patologias. É verdade que muitas vezes o consumo de medicamentos responde a necessidades incontestáveis, se abordarmos a questão do ponto de vista biomédico. Mas a idéia que fica no ar aqui é a de que talvez possamos falar sobre um outro uso possível dos medicamentos, como o que pode ser percebido no caso das “drogas do estilo de vida”. A medicalização da vida tornou o consumo de remédios ato bastante corriqueiro. No que se refere às “pílulas do estilo de vida”, o marketing dos laboratórios farmacêuticos parece agregar ao discurso a respeito de “doenças” um novo argumento que não somente o da “saúde”. Não se trata mais simplesmente de combater “doenças”, mas de manter ou conquistar mais “qualidade de vida”, expressão bastante utilizada, mas cujo significado permanece pouco claro no caso do uso feito pelos laboratórios farmacêuticos. O público leigo de classe média, demandante de bens de saúde, não ignora, por certo, esta forma de falar a respeito de certas doenças e da justificativa para o tratamento. Não estaríamos, então, frente a uma espécie de “química da qualidade de vida”?
(*) Rogério Lopes Azize é doutorando em Antropologia Social (Museu Nacional-UFRJ), mestre em XX Congresso Antropologia Ibero-AmericanaSocial (UFSC).
A química da qualidade de vida: um olhar antropológico sobre o uso de medicamentos e saúde em classes médias urbanas brasileiras
A química da qualidade de vida: um olhar antropológico sobre o uso de medicamentos e saúde em classes médias urbanas brasileiras | |
Autor: | Azize, Rogerio Lopes |
Resumo: | Nesta dissertação, parte-se da idéia de que os conceitos de saúde e doença, além dos limites entre estados considerados normais ou patológicos, têm grande interface com a cultura na qual estão sendo veiculados. Tomo como objeto etnográfico tanto o discurso dos agentes da biomedicina ocidental como o discurso leigo referente aos chamados "remédios do estilo de vida"; a partir deste rótulo veiculado pelos meios de comunicação de massa, selecionei os medicamentos de maior visibilidade, a saber, as pílulas Viagra, Prozac e Xenical, mas sem desprezar pílulas fabricadas por laboratórios concorrentes, com o mesmo objetivo. Procuro demonstrar que, dentro do sistema biomédico, diferentes significados podem ser atribuídos às idéias de doença/saúde, cura e medicamento; esta diferença fica dependente de quem emite o discurso, do lugar social a partir do qual está falando, com quem e com quais fins. Tento colocar em prática a idéia de que os discursos de todos os agentes que circulam dentro do sistema biomédico são passíveis de análise simbólica e discursiva. Isto vale para os usuários das pílulas, como para os médicos e indústrias farmacêuticas. Enquanto o discurso dos agentes da biomedicina concentra-se em uma definição e divulgação das doenças obesidade, depressão e disfunção erétil, os usuários que entrevistei tendem a apresentar um discurso não-patologizado, que prioriza uma história de si. Apesar desta diferença, os diferentes discursos não devem ser analisados de uma forma maniqueísta, visto que estão em constante tensão e se influenciam mutuamente. Trabalho com a hipótese de que expressões nativas como qualidade de vida e estilo de vida, constantemente utilizadas pelos usuários dos medicamentos e pelos agentes da biomedicina ocidental, remetem a um mesmo campo semântico. Tal campo semântico seria delimitador de uma fronteira cultural nas sociedades urbanas ocidentais contemporâneas. |
Descrição: | Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social. |
A nova ordem cerebral: a concepção de 'pessoa' na difusão neurocientífica
A nova ordem cerebral: a concepção de 'pessoa' na difusão neurocientífica
Autor:
Rogerio Lopes Azize
Categoria:
Teses e Dissertações
Resumo
A neurociência contemporânea tem uma pretensão bilíngue: a de investigar a fisiologia cerebral, ao mesmo tempo em que se debruça sobre o que considera ser epifenômenos deste órgão, o que inclui as emoções, os sentimentos, as escolhas e as mais simples ações da vida cotidiana. Em formatos e através de veículos os mais diversos, esta idéia, que constrói uma equivalência entre cérebro e indivíduo, tem sido alvo de intensa divulgação por parte de pesquisadores da área entre o público leigo. Emana daí, para além de saberes sobre o cérebro, uma noção de 'pessoa', tema que esta tese se propõe a investigar. Com este objetivo, articula-se aqui um material etnográfico amplo, que passa pela popularização de neurociência propriamente dita (em livros, teatro, televisão), a publicidade de psicofármacos por parte de laboratórios farmacêuticos (onde se divulgam as 'doenças do cérebro') e representações que atravessam a cosmologia espontânea da cultura ocidental moderna, o que pode ser observado através da presença marcante de um vocabulário cerebralista na mídia em geral, na publicidade e no cinema. O trabalho filia-se à tradição dos estudos de construção social da pessoa, focando em um tema de reflexão que ganhou nuances peculiares nas últimas décadas: uma noção dualista, no formato cérebro/mente, ou corpo/mente, passa a conviver com um dualismo fisicalista, no formato cérebro/corpo.
Autor:
Rogerio Lopes Azize
Categoria:
Teses e Dissertações
Resumo
A neurociência contemporânea tem uma pretensão bilíngue: a de investigar a fisiologia cerebral, ao mesmo tempo em que se debruça sobre o que considera ser epifenômenos deste órgão, o que inclui as emoções, os sentimentos, as escolhas e as mais simples ações da vida cotidiana. Em formatos e através de veículos os mais diversos, esta idéia, que constrói uma equivalência entre cérebro e indivíduo, tem sido alvo de intensa divulgação por parte de pesquisadores da área entre o público leigo. Emana daí, para além de saberes sobre o cérebro, uma noção de 'pessoa', tema que esta tese se propõe a investigar. Com este objetivo, articula-se aqui um material etnográfico amplo, que passa pela popularização de neurociência propriamente dita (em livros, teatro, televisão), a publicidade de psicofármacos por parte de laboratórios farmacêuticos (onde se divulgam as 'doenças do cérebro') e representações que atravessam a cosmologia espontânea da cultura ocidental moderna, o que pode ser observado através da presença marcante de um vocabulário cerebralista na mídia em geral, na publicidade e no cinema. O trabalho filia-se à tradição dos estudos de construção social da pessoa, focando em um tema de reflexão que ganhou nuances peculiares nas últimas décadas: uma noção dualista, no formato cérebro/mente, ou corpo/mente, passa a conviver com um dualismo fisicalista, no formato cérebro/corpo.
sábado, 20 de junho de 2015
Coming Off Psychiatric Drugs: A Harm Reduction Approach to Medication Withdrawal | Will Hall
https://www.youtube.com/watch?v=O4bdG601k4k&app=desktop
Coming Off Psychiatric Drugs: A Harm Reduction Approach to Medication Withdrawal | Will Hall
sexta-feira, 12 de junho de 2015
Antipsiquiatria
Antipsiquiatria
Nascida junto à grande corrente de contestação cultural e política dos anos 60, esse movimento tinha como ponto estratégico críticas ao objeto, às teorias e aos métodos da Psiquiatria e Psicopatologia, proporcionando uma profunda revolução nesse campo. Seus principais autores, Ronald Laing, David Cooper e Aaron Esterson insistiram na idéia de que as concepções "científicas" da loucura e seus recursos de tratamento eram invariavelmente violentas e seriam apenas eufemismos da alienação política, econômica e cultural da sociedade moderna. No período de 1962 a 1966 inicia-se um trabalho independente em uma ala denominada de "Pavilhão 21", com clientela que não havia sido tratada em nenhuma ocasião anterior, seguindo uma nova forma de comunidade terapêutica. Organizavam reuniões que buscavam subverter a hierarquia e disciplina hospitalar, buscando quebrar possíveis resistências às mudanças. Segundo Amarante:
"A Antipsiquiatria busca um diálogo entre a razão e loucura, enxergando a loucura entre homens e não dentro do homem. Critica a nosografia que estipula o ser neurótico, denuncia a cronificação da instituição asilar e considera até a procura voluntária do tratamento psiquiátrico uma imposição do mercado ao indivíduo que se sente isolado da sociedade." (1995, p. 47)
"A psiquiatria tem que ser abolida, assim como a escravidão
http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/509220-qapsiquiatriatemqueabolidaassimcomoaescravidaoqentrevistaespecialcomthomasszasz
Defensor da separação entre psiquiatria e Estado, Szasz é conhecido mundialmente por ser adversário da psiquiatria coercitiva. Escreveu livros como O mito da doença mental (Rio De Janeiro: Zahar, 1979), originalmente publicado em 1960, e A fabricação da loucura: um estudo comparativo da Inquisição e do Movimento de Saúde Mental (Rio de Janeiro: Zahar, 1976), cuja primeira edição veio a público em 1970. Nasceu em Budapeste em 1920 e continua em franca atividade intelectual. Para conhecer seus textos e ideias, acesse www.szasz.com.
"A psiquiatria tem que ser abolida, assim como a escravidão". Entrevista especial com Thomas Szasz
Psiquiatria e Estado precisam ser separados. Além disso, o sujeito deve decidir, ou não, se deve tomar medicamentos psiquiátricos, afirma o professor emérito Universidade do Estado de Nova Iorque.
A “loucura” não é silenciada pela “razão”, rebate Thomas Szasz. “Ela é silenciada por pessoas chamadas de ‘psiquiatras’”. Para o professor emérito da Universidade do Estado de Nova Iorque em Siracusa, “a psiquiatria, intrinsecamente ligada à lei e à execução da lei, não pode ser reformada. Como a escravidão, ela precisa ser abolida”. As declarações foram dadas por Szasz à IHU On-Line na entrevista que concedeu por e-mail. Crítico ferrenho da psiquiatria desde os anos 1950, ele discorda peremptoriamente da legitimidade intelectual-médica dessa área da medicina, assim como da Associação Psiquiátrica Americana e do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM, na sigla em inglês). “Qual é a validade do DSM? É zero, digo eu”. Em seu ponto de vista, a psiquiatria cumpre a função excludente antes ocupada pela religião, e o “controle-confinamento forçado-involuntário de pessoas identificadas como mentalmente doentes é análogo ao controle-confinamento forçado-involuntário de pessoas identificadas como escravas”. Ele tece duras críticas à luta antimanicomial: “Em vez de enfocar a abolição da ‘escravidão psiquiátrica’, os indivíduos identificados com a ‘luta antimanicomial’ enfocaram – equivocadamente, penso eu – a natureza da doença justificando ostensivamente o uso de força psiquiátrica”.

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Confira a entrevista.
IHU On-Line – Desde que escreveu O mito da doença mental, há 51 anos, houve alguma mudança na forma como a psiquiatria trata o “doente mental”? O que permanece o mesmo?
IHU On-Line – Desde que escreveu O mito da doença mental, há 51 anos, houve alguma mudança na forma como a psiquiatria trata o “doente mental”? O que permanece o mesmo?
Thomas Szasz – Houve muitas mudanças. A principal mudança é que agora os psiquiatras sustentam, e a maioria das pessoas acredita, que as chamadas doenças mentais são causadas por “desequilíbrios químicos” no cérebro, ou são manifestações deles e que esses desequilíbrios fictícios são tratados com medicamentos.
IHU On-Line – Em que medida o estigma da doença mental continua sendo um rótulo importante para compreendermos a sociedade segregatória e excludente em que vivemos?
IHU On-Line – Em que medida o estigma da doença mental continua sendo um rótulo importante para compreendermos a sociedade segregatória e excludente em que vivemos?
Thomas Szasz – Todas as sociedades (grupos) são, por definição, “excludentes” pelo fato de incluírem algumas pessoas e excluírem outras. Anteriormente, as religiões cumpriam essa função social. Hoje em dia, a medicina-psiquiatria a cumpre.
IHU On-Line – Quais são os principais avanços que percebe a partir da luta antimanicomial pelo mundo?
IHU On-Line – Quais são os principais avanços que percebe a partir da luta antimanicomial pelo mundo?
Thomas Szasz – Em minha opinião, a questão principal – ou talvez até a única – referente à luta antimanicomial é o poder de exercer coerção, isto é, a legitimação do uso de força contra pessoas chamadas “loucas”, isto é, “diagnosticadas” como “mentalmente doentes”. Considero o controle-confinamento forçado-involuntário de pessoas identificadas como mentalmente doentes análogo ao controle-confinamento forçado-involuntário de pessoas identificadas como escravas. Em vez de enfocar a abolição da “escravidão psiquiátrica”, os indivíduos identificados com a “luta antimanicomial” enfocaram – equivocadamente, penso eu – a natureza da doença justificando ostensivamente o uso de força psiquiátrica. Creio que o controle psiquiátrico à força de indivíduos inocentes é sempre moralmente errado.
IHU On-Line – No Brasil, há uma grande influência de Franco Basaglia na reforma psiquiátrica. Hoje, a desinstitucionalização da loucura tem no agente comunitário e nos Centros de Atenção Psicossocial – CAPs elementos importantes de uma nova prática da saúde mental. Qual é a situação nos EUA no que diz respeito à luta antimanicomial?
IHU On-Line – No Brasil, há uma grande influência de Franco Basaglia na reforma psiquiátrica. Hoje, a desinstitucionalização da loucura tem no agente comunitário e nos Centros de Atenção Psicossocial – CAPs elementos importantes de uma nova prática da saúde mental. Qual é a situação nos EUA no que diz respeito à luta antimanicomial?
Thomas Szasz – A situação é semelhante. Basaglia adorava a associação entre a política (o Estado) e a psiquiatria (coerção médica). Ele queria ser – e a certa altura foi – uma espécie de comissário psiquiátrico – do tipo benevolente, bondoso, é claro. Discordo radicalmente das concepções e políticas dele. Creio que a psiquiatria, intrinsecamente ligada à lei e à execução da lei, não pode ser reformada. Como a escravidão, ela precisa ser abolida, e não reformada.
IHU On-Line – Os doentes mentais continuam sendo os grandes bodes expiatórios da sociedade? Que outros párias estão ao seu lado em nossos dias?
IHU On-Line – Os doentes mentais continuam sendo os grandes bodes expiatórios da sociedade? Que outros párias estão ao seu lado em nossos dias?
Thomas Szasz – Sim e não. Eles geralmente são vistos como “doentes” e necessitados de “cuidados médicos”, quer gostem, quer não.
IHU On-Line – “Se você fala com Deus, você está rezando. Se Deus falar com você, você é esquizofrênico”. Em que medida essa ideia continua atual num mundo que insiste em diagnosticar e medicalizar o sujeito em suas mínimas “dissidências”?
IHU On-Line – “Se você fala com Deus, você está rezando. Se Deus falar com você, você é esquizofrênico”. Em que medida essa ideia continua atual num mundo que insiste em diagnosticar e medicalizar o sujeito em suas mínimas “dissidências”?
Thomas Szasz – A confusão dos sentidos literal e metafórico das palavras – especialmente de termos como “doença”, “tratamento”, “cura”, etc. (e deus, diabo, inferno...) – é essencialmente a mesma que havia nas décadas de 1950 e 1960.
IHU On-Line – Em que sentido a doença mental continua sendo uma metáfora?
IHU On-Line – Em que sentido a doença mental continua sendo uma metáfora?
Thomas Szasz – Oficialmente – do ponto de vista jurídico, médico – ela é literal. Eu sustento que é metafórica. Os chamados antipsiquiatras – Laing, Foucault, Basaglia – a tratam como literal e “tratavam” o “paciente” com drogas, por exemplo, com LSD. Isso é ilustrado pelo apoio que deram à hospitalização involuntária em instituições de saúde mental bem como pela defesa do réu mediante alegação de insanidade, práticas às quais me oponho.
IHU On-Line – O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais aumenta com frequência a catalogação de doenças apontadas como mentais. Qual é a sua validade?
IHU On-Line – O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais aumenta com frequência a catalogação de doenças apontadas como mentais. Qual é a sua validade?
Thomas Szasz – Qual é a validade do DSM? É zero, digo eu. Qual é a legitimidade intelectual-médica da psiquiatria – daAssociação Psiquiátrica Americana e de outras? É zero, digo eu.
IHU On-Line -“Em que sentido a psiquiatria é um braço coercitivo do aparato de Estado?”
IHU On-Line -“Em que sentido a psiquiatria é um braço coercitivo do aparato de Estado?”
Thomas Szasz – Num sentido literal, obviamente. Milhões de pessoas são, e foram, presas em prédios dos quais não podem sair. “Por que os tratamentos médicos dessa especialidade são, em última instância, controle político?” Eles não o são sempre. Milhões de pessoas acreditam que têm doenças mentais e ingerem medicamentos psiquiátricos voluntariamente. Elas são, e deveriam ser, livres para fazer isso. Vejo esse fenômeno como semelhante à crença de milhões de pessoas de que houve um judeu que viveu na Palestina da época bíblica e que foi crucificado e se tornou deus. As pessoas são, e deveriam ser, livres para “ingerir” os sacramentos. Chamamos isso de “liberdade religiosa”. Eu defendo a “liberdade psiquiátrica”. Só me oponho à tirania psiquiátrica, assim como só me oponho à tirania religiosa. É por isso que tenho defendido a separação entre a psiquiatria e o Estado.
IHU On-Line – Nietzsche e Foucault compreendiam a loucura como experiência originária, silenciada pela razão e seu “monólogo”. Qual é o seu ponto de vista?
IHU On-Line – Nietzsche e Foucault compreendiam a loucura como experiência originária, silenciada pela razão e seu “monólogo”. Qual é o seu ponto de vista?
Thomas Szasz – Eu rejeito esse tipo de retórica. A “loucura” não é silenciada pela “razão”. Ela é silenciada por pessoas chamadas de “psiquiatras”.
IHU On-Line – Gostaria de acrescentar algum outro aspecto não questionado?
IHU On-Line – Gostaria de acrescentar algum outro aspecto não questionado?
Thomas Szasz – Sinto-me contente e satisfeito por ter tido a oportunidade de expressar profissional e politicamente opiniões não convencionais e ter atraído certo grau de interesse e concordância com elas. Atribuo isso em grande parte à relativa abertura e tolerância da sociedade americana apoiada por uma tradição jurídica anglo-americana que valoriza a liberdade pessoal e a responsabilidade individual.
Por Márcia Junges
quinta-feira, 28 de maio de 2015
domingo, 24 de maio de 2015
Franny e Zooey - J.D. Salinger
"Eu só estou cansado de ego, ego, ego. Minha própria e de todo mundo. Estou cansado de todo mundo que quer chegar a algum lugar ... "
30: "Estou cansado de não ter a coragem de ser um ninguém absoluta. Estou farto de mim e toda a gente que quer fazer algum tipo de coisa especial" Franny e Zooey - J.D. Salinger
30: "Estou cansado de não ter a coragem de ser um ninguém absoluta. Estou farto de mim e toda a gente que quer fazer algum tipo de coisa especial" Franny e Zooey - J.D. Salinger
Senso Comum e características
Sociologia 1º Ano - Senso Comum e características
"O
senso comum é um saber que está presente em todas as
sociedades e em todos os indivíduos (todos são dotados de senso
comum). Mas o senso comum é plural, variando de sociedade para
sociedade e modificando-se com o decorrer dos tempos.
O
senso comum, enquanto princípio de sociabilidade,
constitui o acordo mínimo exigível para que qualquer sociedade
funcione como tal; ele assegura a coesão indispensável para que se
possa falar de comunidade e de vida coletiva.
Ele
é princípio de equilibração, essencial a toda
a sociedade, entre a dimensão do indivíduo e a dimensão do
coletivo ou dito de outra forma, da sujeição do indivíduo às
normas da vida coletivo.
O
senso comum é também o senso tradicional.
Costumamos dizer: "sempre foi assim" para justificar um
procedimento que nos criticam.
O
senso comum transporta e naturaliza um conjunto de convenções
implícitas ou intrínsecas ao agir humano coletivamente
dimensionado. Neste sentido, ele é conducente ou solidário de uma
aceitação que assinala uma passividade inerente e
indispensável face às exigências práticas e pragmáticas da
vida. Como se adquire o senso comum? Ele é fruto da
aprendizagem e educação que espontânea e/ou institucionalmente
recebemos enquanto membros de uma comunidade."
José
Manuel Girão e Rui Alexandre Grácio
As
principais características do senso comum
Caráter
empírico – o senso comum é um saber que deriva
diretamente da experiência quotidiana, não necessitando, por isso
de uma elaboração racional dos dados recolhidos através dessa
experiência.
Caráter
acrítico – não necessitando de uma elaboração
racional, o senso comum não procede a uma crítica dos seus
elementos, é um conhecimento passivo, em que o
indivíduo não se interroga sobre os dados da experiência, nem se
preocupa com a possibilidade de existirem erros no seu conhecimento
da realidade.
Caráter
assistemático – o senso comum não é estruturado
racionalmente, tanto ao nível da sua aquisição, como ao nível da
sua construção, não existe um plano ou um projeto racional que
lhe dê coerência.
Caráter
ametódico – o senso comum não tem método, ou seja, é
um saber que não segue nenhum conjunto de regras formais. Os
indivíduos adquirem-no sem esforço e sem estudo. O senso comum é
um saber que nasce da sedimentação casual da experiência captada
ao nível da experiência quotidiana ( por isso se diz que o senso
comum é sincrético).
Caráter
aparente ou ilusório – Como não há a preocupação de
procurar erros, o senso comum é um conhecimento que se contenta com
as aparências, formando por isso, uma representação ilusória,
deturpada e falsa, da realidade.
Caráter
coletivo – O senso comum é um saber partilhado pelos
membros de uma comunidade, permitindo que os indivíduos possam
cooperar nas tarefas essenciais à vida social.
Caráter
subjetivo – O senso comum é subjetivo, porque não é
objetivo: cada indivíduo vê o mundo à sua maneira, formando as
suas opiniões, sem a preocupação de as testar ou de as
fundamentar num exame isento e crítico da realidade.
Caráter
superficial – O senso comum não aprofunda o seu
conhecimento da realidade, fica-se pela superfície, não procurando
descobrir as causas dos acontecimentos, ou seja, a sua razão de ser
que, por sua vez, permitiria explicá-los racionalmente.
Caráter
particular – o senso comum não é um saber universal,
uma vez que se fica pela aquisição de informações muito
incompletas sobre a realidade ( por isso também se diz que ele
éfragmentário ), não podendo, assim, fazer
generalizações fundamentadas.
Caráter
prático e utilitário – O senso comum nasce da prática
cotidiana e está totalmente orientado para o desempenho das tarefas
da vida quotidiana, por isso as informações que o compõem são o
mais simples e diretas possível.
Fonte:
http://www.espanto.info/
http://sociologialimite.blogspot.com.br/2009/03/senso-comum-e-suas-caracteristicas.html
sábado, 23 de maio de 2015
quinta-feira, 21 de maio de 2015
Dá pra fazer (filme)
Dica de filme:
(Si può fare)
1h47min – Comédia Dramática - 2008
Direção: Giulio Manfredonia
Elenco: Claudio Bisio, Anita Caprioli, Giuseppe Battiston...
País de origem: Itália
1h47min – Comédia Dramática - 2008
Direção: Giulio Manfredonia
Elenco: Claudio Bisio, Anita Caprioli, Giuseppe Battiston...
País de origem: Itália
Sinopse: "Nello, um sindicalista afastado do sindicato por suas ideias avançadas, se vê dirigindo uma cooperativa de doentes mentais, ex pacientes dos manicômios fechados pela Lei Basaglia. Acreditando firmemente no trabalho, ele convence os sócios a substituir as esmolas assistencialistas por um trabalho de verdade, inferindo para cada um, uma atividade incrivelmente adaptada às respectivas capacidades, mas indo também de encontro às inevitáveis e humanas contradições."
Retrata vários aspectos da transição ainda vigente dos manicômios para sistemas abertos de atenção às pessoas com transtornos mentais graves e/ou persistentes, tanto os positivos, quanto os negativos e sua complexidade. A começar pela temática, uma cooperativa de geração de renda, que existe hoje em vários serviços substitutivos, mas em muitos deles a renda não vai para o usuário que trabalha, mas para a instituição, no caso do filme a renda se transforma nos salários dos usuários, os sócios. Há impasses como o olhar repressor de um poder médico que crê na não socialização das pessoas que convivem com transtornos mentais, que no filme criticam a Lei Basaglia, marco importantíssimo e referencial para a Reforma Psiquiátrica brasileira. Mostra também a questão da medicação exagerada das pessoas, os impedindo de exercer quaisquer atividades que não seja perambular pelo ambiente, reforçando seu estigma de "louca". Também o oposto disso, quando entendem que o melhor é a diminuição da medicação, há a pressão dos laboratórios com mimos para os médicos que prescrevem seus produtos. O filme também trata da sexualidade dos usuários de serviços de saúde mental, com altas doses de medicação, sem altas doses. A descoberta do sexo, a vivência das paixões, do apaixonar-se, do frustrar-se. A visão da família, representando uma esfera da sociedade que consideram os usuários de serviços de saúde mental como crianças, "anjos". Expõe também, de forma bastante interessante, as nuances das crises e surtos psíquicos, os modos de atenção a eles e as consequências quando há falhas, quando escapam detalhes. Inseridas às questões de saúde mental, a temática do sindicalismo, pressão do mercado, exploração de trabalhadores e greves são trazidas pelo filme, mesmo que de forma leve. É um belíssimo filme. Dos que já vi sobre saúde mental, é o que abarca mais temáticas e de forma incrivelmente sensível e prática. Recomendadíssimo!
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