No entanto, não reside aí o problema crucial do esquema mertoniano. O seu caráter “conservador” não se deve ao fato de enfatizar a harmonia e o equilíbrio na vida social. Pode ser até capaz de perceber as funções de conflitos, distúrbios, desequilíbrios etc. A questão concentra-se no fato de esta análise ter como premissa uma estrutura social não problematizada. Ou seja, a unidade de análise é um sistema social já dado, “funcionando”. A harmonia e o equilíbrio, a partir daí, surgem automaticamente. Existe uma fase hipotética, inicial, quando o sistema está “funcionando normalmente”. O processo de mudança social pode ocasionar desequilíbrios e conflitos, mas a tendência “natural” será o retorno a um estado de equilíbrio e harmonia. Mesmo que surjam modificações na estrutura social, haverá um momento em que as coisas se encaixarão nos respectivos lugares e os níveis social e cultural voltarão a se ajustar. Uma nova ordem poderá até ter sido instaurada. Logo não se trata de rotular esta abordagem de “imobilista”, pois ela é capaz de prever a mudança. A questão é que se esta não é necessariamente catastrófica sempre tem um caráter de excepcionalidade. É um tempo “perigoso”, “imprevisível”, propício a desordens e à anomie.
O estudo do comportamento desviante: a contribuição da antropologia social
GILBERTO VELHO
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