O “desviante”, dentro da minha perspectiva, é um indivíduo que não está fora de sua cultura mas que faz uma “leitura” divergente. Ele poderá estar sozinho (um desviante secreto?) ou fazer parte de uma minoria organizada. Ele não será sempre desviante. Existem áreas de comportamento em que agirá como qualquer cidadão “normal”. Mas em outras áreas divergirá, com seu comportamento, dos valores dominantes. Estes podem ser vistos como aceitos pela maioria das pessoas ou como implementados e mantidos por grupos particulares que têm condições de tornar dominantes seus pontos de vista. O fato é que não é o ocasional gap entre a estrutura social e a cultural mas sim o próprio caráter desigual, contraditório e político de todo o sistema sociocultural que permite entender esses comportamentos. Assim, pode-se perceber não só o sociocultural em geral mas, particularmente, o político nas mais “microscópicas” instâncias do sistema sociocultural. É neste nível microssocial que talvez possa estabelecer-se um ponto de encontro entre as tradições “psicológicas” e “socioculturais”. Nada era mais “individual” do que a doença mental. No entanto, toda uma outra perspectiva se abre quando Cooper diz: “Esquizofrenia é uma situação de crise microssocial, na qual os atos e experiências de determinadas pessoas são invalidados por outras, em virtude de certas razões inteligíveis, culturais e microculturais (geralmente familiares), a tal ponto que essa pessoa é eleita e identificada como sendo ‘mentalmente doente’ de certa maneira, e, a seguir, é confirmada (por processos específicos, mas altamente arbitrários de rotulação) na identidade de ‘paciente esquizofrênico’ pelos agentes médicos ou quase médicos14.”
O estudo do comportamento desviante: a contribuição da antropologia social - Texto do antropólogo Gilberto Velho
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